Há apenas 90 anos, as mulheres puderam votar e serem votadas no Brasil. O marco histórico aconteceu durante as eleições para a Assembleia Nacional Constituinte, em 1933 - o direito feminino ao voto foi garantido em todos os estados brasileiros em 1932.
Quase um século depois, as mulheres representam mais da metade do eleitorado brasileiro, mas ocupam apenas 15% dos cargos elegíveis - os dados se referem ao período entre 2016 e 2022.
O voto feminino foi fruto de uma luta que já durava mais de 100 anos. Desde o século XIX, o tema era debatido no parlamento do país por influência da imprensa e da discussão sobre os direitos das mulheres.
A Constituição de 1894 não trazia nenhum impedimento ao voto das mulheres, mas também não especificava o direito.
Primeiro título
A primeira mulher a tirar um título de eleitor foi Celina Guimarães Vianna. Natural de Natal, no Rio Grande do Norte, a professora pediu à justiça a sua inclusão na lista de eleitores do estado em 1927. Ao receber uma decisão favorável, Celina foi até o Senado Federal pedir para que todas as mulheres também tivessem esse direito. Além da professora ser a pioneira do voto feminino no Brasil, ela também é considerada a primeira eleitora da América Latina.
Após a aprovação do Código Eleitoral de 1932, esse direito foi expandido a todas as brasileiras. O Decreto nº 21.076 garantiu às mulheres acima de 21 anos os direitos de votarem e serem votadas em todo o território nacional, segundo o Tribunal Superior Eleitoral.
Constituição de 1934
Os direitos foram assentados na nova constituição de 1934. No mesmo ano, o Brasil teve a primeira mulher eleita deputada federal: Carlota Pereira de Queirós.
Apesar dos direitos conquistados, eles ainda não eram amplos o suficiente. Até o Código Eleitoral de 1965, o voto para as mulheres era facultativo - somente as que trabalhassem como funcionárias públicas eram obrigadas a votar.
De acordo com a cientista política Bruna Camilo, o voto facultativo escondia preconceitos. “Antes o voto não era obrigatório, pois as mulheres eram vistas como incapazes. Então, não fazia sentido obrigar a mulher a votar, como faziam com os homens”, conta.
Segundo Bruna, mesmo com o direito ao voto, a participação feminina ainda era pequena. “A princípio este direito era limitado às mulheres da elite, que eram alfabetizadas e tinham uma condição social mais elevada. As mulheres negras e mais pobres acabavam excluídas do sistema, pois outras pautas mais importantes, como o trabalho e o cuidado com os filhos, ocupavam o tempo dessas mulheres”, explica.
Mulheres na Política
De acordo com um levantamento do Tribunal Superior Eleitoral (TSE), as mulheres constituem 52% do eleitorado brasileiro. Mas, mesmo sendo mais da metade dos eleitores, elas ainda não conseguem ser eleitas na mesma proporção. Entre as eleições de 2016 e 2022, as mulheres representavam 33% dos candidatos e 15% dos eleitos.
“As mulheres ainda sofrem muito dentro da política, os partidos não respeitam a paridade de gênero, não valorizam a mulher e não as formam enquanto lideranças políticas. Somos uma democracia, mas a participação das mulheres ainda é deficitária”, diz a cientista política.
Em relação à ocupação feminina no parlamento, os dados do TSE também mostram que as mulheres ocupam 17,7% dos cargos no Congresso Nacional. Entre os países com a maior participação feminina no congresso, o Brasil está em 127° lugar na lista.
“Infelizmente a maioria dos cargos ainda é ocupada por homens, brancos e héteros. Somos quase 18% no congresso. Claro que ainda é pouco, pois somos a maioria da população, mas temos que comemorar os pequenos avanços”, aponta.
A cientista ainda relembra a importância de haver mais mulheres na política para que temáticas femininas ganhem o devido destaque. “Através da presença feminina no congresso que pudemos, por exemplo, discutir o combate à pobreza menstrual. [Deste debate surgiu uma lei que garante a distribuição de absorvente para estudantes de escolas públicas e mulheres em situação de vulnerabilidade]. Apenas com mais mulheres na política poderemos avançar em outras pautas que hoje são negligenciadas”, acrescenta.
*Sob supervisão de Enzo Menezes