A mama-cadela é uma fruta nativa do Cerrado brasileiro ainda pouco conhecida, mas que se destaca por suas características únicas. Pequena, de coloração amarela a alaranjada, possui uma polpa doce e fibrosa, o que lhe rendeu o apelido carinhoso de “chicletinho do Cerrado”.
Com poucas informações sobre a composição nutricional da fruta, a nutricionista e professora da Universidade Federal de Uberlândia (UFU), Grazieli Pascoal, decidiu aprofundar seus estudos sobre o tema durante seu pós-doutorado. Seu objetivo era resgatar e valorizar frutos negligenciados pela população, trazendo conhecimento sobre suas propriedades nutricionais.
Pesquisas conduzidas na Faculdade de Ciências Farmacêuticas (FCF) da USP indicaram que a mama-cadela é rica em compostos bioativos, carotenoides e fibras. Esses elementos, apesar de não serem considerados nutrientes essenciais, desempenham funções importantes no organismo, especialmente por seus efeitos antioxidantes.
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As frutas utilizadas no estudo foram coletadas em Uberlândia, no Triângulo Mineiro, por um pequeno produtor e transportadas congeladas para São Paulo. Em um laboratório, foram analisadas para determinar seus carboidratos, gorduras, proteínas, vitaminas, fibras, calorias e açúcares. Os resultados apontaram que a mama-cadela é uma excelente fonte de vitamina A, sob a forma de carotenoides, além de conter vitamina C e fibras.
As informações foram publicadas no Journal of the Brazilian Chemical Society e apresentados na 24ª Semana Farmacêutica de Ciência e Tecnologia da FCF, em 2021, evento no qual Pascoal recebeu uma menção honrosa por sua pesquisa.
Benefícios nutricionais
De acordo com a Ministério da Saúde, a deficiência de Vitamina A tem repercussões que afetam as estruturas epiteliais de diferentes órgãos, sendo os olhos os mais atingidos. A Vitamina A é essencial ao crescimento e desenvolvimento do ser humano. Atua também na manutenção da visão, no funcionamento adequado do sistema imunológico (defesa do organismo contra doenças, em especial as infecciosas), mantém saudáveis as mucosas (cobertura interna do corpo que recobre alguns órgãos como nariz, garganta, boca, olhos, estômago) que também atuam como barreiras de proteção contra infecções.
A fruta também é fonte de vitamina C, importante para a ação antioxidante no organismo e para a absorção do ferro. Em termos de concentração, a quantidade dessa vitamina em uma porção equivale a um quarto de laranja, sendo suficiente para atender até 18% da recomendação diária para mulheres adultas.
Outro benefício da mama-cadela está em seu teor de fibras, que contribuem para a saúde gastrointestinal e para o equilíbrio da microbiota intestinal, fornecendo cerca de 10% da ingestão diária recomendada para adultos.
Valorização da biodiversidade alimentar
Com a divulgação das propriedades nutricionais da mama-cadela, Pascoal espera que a valorização dessa e de outras frutas nativas aumente, promovendo o resgate de saberes tradicionais e incentivando a preservação da biodiversidade brasileira.
Nos últimos anos, o consumo de alimentos ultraprocessados tem aumentado no Brasil, enquanto a ingestão de alimentos naturais diminui, impactando negativamente a saúde da população. Em 2019, mais de 50% das mortes no país foram causadas por doenças crônicas, segundo dados do Ministério da Saúde.
“A nossa alimentação está muito monótona”, alerta Pascoal, destacando que muitos alimentos tradicionais foram esquecidos. O professor Eduardo Purgatto, orientador do estudo, reforça a importância de conhecer e valorizar esses alimentos, não apenas para promover uma alimentação mais diversificada e saudável, mas também para influenciar políticas públicas.
Os pesquisadores também apontam a necessidade de apoio aos produtores rurais. Como a demanda por frutas nativas é baixa, muitos agricultores acabam priorizando cultivos mais comerciais. Para Pascoal e Purgatto, políticas públicas são fundamentais para incentivar a produção e comercialização desses alimentos.
Além do estudo sobre a mama-cadela, Pascoal trabalha no desenvolvimento da Tabela de Composição de Alimentos Regionais e da Biodiversidade Brasileira, em parceria com o Centro de Incubação de Empreendimentos Populares Solidários (Cieps) da UFU. Esse projeto visa catalogar e divulgar informações sobre alimentos nativos, promovendo sua valorização e inclusão na alimentação cotidiana da população brasileira.