Todos os meses, o produtor rural e engenheiro agrônomo José Carlos Gonçalves, de São Sebastião do Paraíso, jogava cerca de 20% de sua produção de abacates no lixo. Não que faltasse a eles qualidade, apenas tinham alguma característica que os fazia ser considerados “fora do padrão de mercado”. Ele conta que chegou a perder o sono pensando em alternativas para evitar essas perdas e, depois de muito pesquisar e trocar ideias com especialistas, decidiu investir em uma agroindústria familiar com foco na produção de azeite e de cosméticos.
Ele começou a trabalhar com a fruta na década de 1980 em Cajuru, no estado de São Paulo e, posteriormente, expandiu a cultura para suas propriedades em Minas.
“Há uns dez anos, eu soube que a Epamig estava extraindo azeite de oliva, em Maria da Fé, e que o método de centrifugação poderia ser usado também para a extração do óleo de abacate. Entrei em contato, peguei 12 caixas de abacate (seis da variedade Margarida e seis da variedade Breda), coloquei na caminhonete e fui até lá. Fiquei lá por dois ou três dias e obtivemos o azeite, daí eu falei vamos em frente”, conta.
Produção do azeite
Pioneira na extração de azeite de oliva extravirgem no Brasil, a Epamig começou a testar a extração do abacate pelo método de centrifugação para garantir o uso do maquinário em períodos de entressafra da oliveira. A colheita de azeitonas se concentra entre os meses de janeiro e abril.
Carlos Alberto Gonçalves, filho de José Carlos, conta que a Epamig foi fundamental no desenvolvimento da tecnologia e implementação do projeto. A diretora-presidente da instituição, Nilda Soares, disse que estruturar novas cadeias produtivas faz parte da missão da empresa. “ Na cadeia produtiva do azeite de oliva, oferecemos desde tecnologias do cultivo à disponibilização do produto aos consumidores e também alternativas para a entressafra, como é o caso do azeite de abacate”.
Agroindústria e empreendedorismo
Carlos Alberto Gonçalves lembra que o começo da empresa Flor do Abacate não foi fácil. “A gente queria fazer um lagar (ambiente e conjunto de máquinas que fazem extração) industrial, mas não havia muitas informações. Mesmo a Epamig tinha, à época, uma extratora de pequeno porte. Não tínhamos de quem copiar. Fizemos contato com uma marca italiana especializada nesses equipamentos, mas os custos para a implantação da agroindústria eram inviáveis, cerca três milhões de euros”.O jeito, então, foi realizar um projeto próprio. “Contratamos um engenheiro químico e um engenheiro civil para a implantação do projeto físico e fomos aos poucos comprando o maquinário, despolpadora de uma indústria, centrífuga de outra, equipamentos de inox usados, tanques e trocadores. Fomos descobrindo o processo no caminho”.
A obtenção do azeite também teve percalços. “Não foi algo que deu certo no início. O abacate tem uma propriedade que amarga quando a temperatura sobe durante a extração. Temos que manter a temperatura ambiente. Hoje temos um processo que ainda demanda melhorias, mas que nos permite levar bons resultados para a mesa do consumidor”, afirma.
Sustentabilidade é diferencial
Carlos Alberto ressalta que, hoje, o empreendimento é altamente sustentável. “A gente não perde nada. Temos a produção de cosméticos com o azeite de abacate que oferece: creme hidratante para os pés; creme finalizador anti-frizz; manteiga corporal; blend de óleos para a pele; máscara de hidratação intensa, creme nutritivo para o rosto e, recentemente, inauguramos uma fábrica de sabonete e shampoo sólido.
Além disso:
a lenha da caldeira vem do abacate e do café.
a energia fotovoltaica supre toda a demanda.
a polpa da fruta é usada como adubo.
e o caroço do abacate deu origem a um larvicida natural, já patenteado, para o combate ao Aedes aegypti (transmissor de arboviroses como dengue, zika, chikungunya e febre amarela).
criação de uma maionese de abacate, já aprovado pela Anvisa.
Cosméticos e mineiridade
Júnia Gonçalves, esposa de Carlos Alberto anos, ficou responsável pelo desenvolvimento de cosméticos e conta que estudou bastante o assunto antes de montar a linha de produção.
“A gente tinha visto alguma coisa, pouca coisa na verdade, sobre isso. Então pensamos, José Carlos e eu, por que não o abacate? Algo tão tropical, tão brasileiro. Começamos nossas tentativas e demorou um tempo para chegarmos ao primeiro produto”, detalha.
O coordenador do Programa Estadual de Pesquisa em Olivicultura da Epamig, Luiz Fernando de Oliveira, destaca que os cosméticos são uma ótima alternativa para agregar valor à produção. “O azeite de abacate tem em sua composição uma grande concentração de ácido oleico, que é uma gordura insaturada, e também um alto teor de polifenol, duas substâncias bastante desejadas pela indústria cosmética”.
Hoje a marca Avolovers possui uma gama de produtos veganos, que inclui hidratantes corporais para os pés, para as mãos e para os lábios, linha facial e capilar, vendidos em loja própria e pelo site. “Acredito que os nossos produtos têm uma forte associação com a origem, despertam esse orgulho de ser mineiro, de ser paraisense”, afirma Júnia.
A família Gonçalves já prepara um novo empreendimento em São Sebastião do Paraíso. “Estamos com o projeto arquitetônico em andamento e já preparando o cardápio de um restaurante temático, no qual todas as preparações usarão o azeite de abacate”, adianta Carlos Alberto. “O que a gente ganha, a gente investe aqui em Minas, na indústria, no bem-estar dos nossos empregados. Sou paulista, mas sou filho de mineiro e pai de mineiras. Estou aqui há 30 anos, me sinto mineiro e tenho orgulho disso”.
(*) Com informações da Epamig