Participe do canal e receba as Orações da Itatiaia no WhatsApp

Padre Samuel Fidelis | Princípio do fim

Se paramos para refletir, ao longo de doze meses conjugam-se processo, etapa, avanço - e, simultaneamente, um movimento cíclico que nos devolve a nós mesmos

Padre Samuel Fidelis

Lá estamos nós, no princípio do fim. E não dá para negar a paixão coletiva pelo mês de dezembro. Seja pela ansiedade em reencontrar pessoas, comer sem culpa, gastar o décimo terceiro; seja pela antipatia de quem não se anima com a ideia de rever agregados, cunhados, ou discutir coisas tão sérias quanto o destino da uva-passa na ceia. Ninguém passa ileso a essa energia que brota do fim do ano.

Tomemos por empréstimo as palavras de Roberto Toledo:

“Quem teve a ideia de cortar o tempo em fatias,

a que se deu o nome de ano, foi um indivíduo genial.

Industrializou a esperança, fazendo-a funcionar no limite da exaustão.

Doze meses dão para qualquer ser humano se cansar e entregar os pontos.”

É curioso pensar o tempo em “fatias”. Lidamos melhor com as coisas quando as compartimentamos. Se paramos para refletir, ao longo de doze meses conjugam-se processo, etapa, avanço - e, simultaneamente, um movimento cíclico que nos devolve a nós mesmos. Por um lado, a vida progride, nunca somos exatamente quem éramos. Por outro, como alertou Nietzsche, é sábio não sermos tão pretensiosos: há um quê de eterno retorno, uma circularidade que nos reencontra.

E é igualmente curioso pensar numa esperança industrializada. Há, sim, um quê de consumo nas festas natalinas. Uma compulsão coletiva pelas compras. Na falta de sermos - ou na pouca pretensão de sê-lo profundamente - acabamos por definir-nos pelo que produzimos e consumimos.

Mas talvez seja bom enxergar também o lado luminoso: nesse tempo nos tornamos mais generosos, ofertamos presentes, aproximamo-nos da leveza e da farra das crianças. No fim do ano, estamos grávidos do novo que há de vir.

E há o cansaço. Vivemos numa rotina desenfreada, sem saber muito bem em busca de quê. Talvez seja mais que cansaço - exaustão. Faz bem permitir-se pausas e distrações. Afinal, o sentido da vida, a motivação para o fazer, também nascem do fracasso, da desilusão, do desvio, da distração, do equívoco fecundo...

Se observarmos bem, as melhores ideias não surgem na mesa de trabalho, mas caminhando à beira da praia, debaixo de roupas curtas demais, ou no banheiro fazendo aquilo que, por mais pressa que se tenha, ninguém terceiriza.

Que nos seja dado um pouco de inocência (e cuidado com o limite do cartão de crédito!). Não foi um ano fácil, mas estamos mais fortes.

Até aqui nos ajudou o Senhor. (1Sm 7,12)

Leia também

Pró-reitor de comunicação do Santuário Basílica Nossa Senhora da Piedade. Ordenado sacerdote em 14 de agosto de 2021, exerceu ministério no Santuário Arquidiocesano São Judas Tadeu, em Belo Horizonte.

Ouvindo...