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Ziraldo foi preso por oposição à ditadura em ‘O Pasquim’, jornal fundado por ele

Cartunista também chegou a receber indenização superior a R$ 1 milhão do Estado por causa da repressão que sofreu neste período

Ziraldo morreu aos 91 anos neste sábado (6)

Ziraldo Alves Pinto, que morreu neste sábado (6), aos 91 anos, foi um dos fundadores do periódico “O Pasquim”, criado em 1969, “ano de chumbo”, como ele mesmo definiu por causa da ditadura. O cartunista chegou a afirmar que o jornal foi feito na “improvisação” e que “revolucionou o estilo de entrevista no Brasil”. Afinal, na falta de alguém para tirar a entrevista do gravador, ela ia para o ar do jeito que era feita.

O jornal foi criado por ele e outros jornalistas e cartunistas como Jaguar (Sérgio de Magalhães Gomes Jaguaribe), Henfil (Henrique de Souza Filho) e Millôr Fernandes. O periódico, que tecia críticas à ditadura, rendeu ao cartunista três prisões.

A Biblioteca Nacional Digital, BNDigital, que busca preservar a memória documental brasileira, traz relatos de Ziraldo sobre este período.

“A gente tinha, na época do Pasquim, época da ditadura, quer dizer, todo mundo silenciado, e nós todos tivemos o privilégio de não ficar calado. Quer dizer, de não engolir o que os caras queriam enfiar pela garganta da gente. E isso é muito salutar, entendeu? Então as pessoas que foram para o Pasquim, foram porque acharam um espaço para poder desenvolver a sua indignação”, relembrou o cartunista.

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O cartunista contou, ainda, que o Pasquim foi “um privilégio”, tendo em vista os “anos de chumbo” que precisou atravessar em sua vida. “Eu pude atravessar a ditadura toda no Pasquim — em vez de ficar em casa chorando as mágoas, usamos as páginas do jornal para enfrentar a ditadura. Simultaneamente ao Pasquim, que não rendia dinheiro pra gente, fui um dos primeiros profissionais brasileiros a assinar peças publicitárias”, detalhou.

Em 2008, ele chegou a receber indenização de mais de R$ 1 milhão do Estado por causa da repressão que sofreu neste período.

Prisão

Ziraldo também falou sobre o período em que esteve preso, no qual ele teve uma “crise de choro”. Ele desmentiu que havia sido detido por causa de “um balãozinho em D. Pedro com a frase: ‘Eu quero é mocotó’, na cópia do quadro de Pedro Américo sobre a proclamação da Independência”.

Segundo Ziraldo, não havia um motivo determinado. “Primeiro eles nos prenderam, depois foram pesquisar o jornal para encontrar uma justificativa para cada prisão”, recordou.

Na prisão, conforme o cartunista, eles tomavam “banho de lua” no período da noite enquanto eram vigiados por “caras com metralhadoras”.

Menino Maluquinho

O personagem “O Menino Maluquinho” foi criado por ele na década de 80, “quando a ditadura voltou para os quartéis e o Pasquim perdeu o vigor”.

“O livro fez tanto sucesso que eu virei autor para criança e sobrevivo hoje como autor para criança”, comentou.

Morte

O cartunista Ziraldo Alves Pinto, de 91 anos, morreu neste sábado (6). O escritor estava em seu apartamento, no bairro da Lagoa, no Rio de Janeiro, quando veio a óbito.

Ziraldo nasceu em Caratinga, no Vale do Rio Doce, no dia 24 de outubro de 1932.

O mineiro atuava como cartunista desde o início da década de 1950. Paralelamente à carreira artística, se graduou em Direito na Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG) em 1957.

Além de “O Menino Maluquinho”, que, de livro, foi transformado em livro e série televisiva, o desenhista se notabilizou, por exemplo, pela revista em quadrinhos “A Turma do Pererê”, que também ganhou adaptação audiovisual.

O primeiro livro do mineiro, “Flicts”, foi lançado em 1969. A obra conta a história de Flicts, um tom do bege que se sente isolado por não conseguir se encaixar nas cores do arco-íris.

O Centro Cultural Banco do Brasil (CCBB) do Rio de Janeiro (RJ) expõe, atualmente, a mostra interativa “Mundo Zira”, que conta a trajetória artística do cartunista.

Com informações de Guilherme Peixoto


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Patrícia Marques é jornalista e especialista em publicidade e marketing. Já atuou com cobertura de reality shows no ‘NaTelinha’ e na agência de notícias da Associação Mineira de Rádio e Televisão (Amirt). Atualmente, cobre a editoria de entretenimento na Itatiaia.