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Condenado por Lei Maria da Penha não pode ocupar cargo público? Especialistas explicam

Proibição entrou em vigor em São Paulo, na semana passada; veja como é em Belo Horizonte

Prefeitura de SP sanciona lei que proíbe nomeação de condenados por Lei Maria da Penha

Na semana passada, o prefeito Ricardo Nunes (MDB) de São Paulo sancionou uma lei que proíbe a contratação de pessoa condenada, sem chance de recorrer, por um crime previsto pela Lei Maria da Penha (11.340/2006), de exercer cargo ou emprego público na cidade. E o que diz a lei em Belo Horizonte? E em Minas? Há alguma lei ou projeto de lei semelhante para o estado?

A nova lei em São Paulo

Publicada no Diário Oficial de São Paulo na última quarta-feira (18), ela determina que: “fica vedada a nomeação de pessoa condenada, por sentença criminal com trânsito em julgado e fundamentada na Lei Maria da Penha, para exercer cargo ou emprego público no Município de São Paulo, inclusive nos âmbitos do Poder Legislativo e da Administração Indireta.”

A proibição acontece enquanto a pessoa estiver cumprindo a pena.

O projeto de lei começou a ser discutido em 2021 e foi aprovado pela Câmara em segundo turno no fim do ano passado.

O projeto de lei em Belo Horizonte

Belo Horizonte não tem lei sobre o assunto. Houve discussão na Câmara Municipal sobre o projeto, porém ele não foi aprovado. O projeto de Lei 418/2022 tinha como objetivo proibir a nomeação de aprovados em concurso público condenados por violência doméstica.

O PL, de autoria do vereador Juliano Lopes, tramitou em setembro de 2022 e foi arquivado com parecer da Comissão de Legislação e Justiça. Isso porque a comissão considerou o projeto inconstitucional.

O que dizem os especialistas?

Carla Silene, advogada criminalista e professora no Instituto Brasileiro de Mercado de Capitais (IBMEC) explica que a texto da Lei Maria da Penha não proíbe a contratação da pessoa que comete o crime, porém garante que a vítima do crime possa ficar afastada do trabalho por até seis meses e não perder o emprego, quando necessário. Ou seja, não fala sobre a proibição de assumir cargos públicos.

Entretanto, a especialista explica que entidades, empresas, estados, estão impedindo a contratação de condenados por violência doméstica.

Marcelo Peixoto, advogado criminalista e professor da Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais (PUC-Minas), explica que a pessoa não será impedida de se candidatar ao cargo público, mas deve ficar atenta ao edital. Se o candidato for aprovado, ele pode ser impedido de assumir o cargo por causa da condenação.

Quem cometeu algum crime, pode ser impedido de assumir cargo público?

Hoje, os concursos públicos têm uma fase chamada de ‘’investigação social’’. “Nela, pessoas que possuem uma sentença condenatória transitada em julgado terão o que chamamos de maus antecedentes”, explica Carla Silene. Ou seja, quem foi condenado por qualquer crime e que não pode recorrer da sentença do juiz, vai ter maus antecedentes e pode ser impedido de assumir o cargo. Vale ressaltar que o edital é que determina como isso será avaliado.

Porém, essa proibição só deve acontecer enquanto a pessoa ainda cumpre a pena. “Se já se passou um lapso temporal significativo do cumprimento da pena, do tipo de crime cometido e da conduta do candidato após cumprimento da pena, não deveria ser o candidato impedido de assumir o cargo”, apontou a especialista.

Essa é a solução?

Para Marcelo, a lei sancionada em São Paulo não é uma boa alternativa. Para ele, cada caso deve ser analisado individualmente. “Esse impedimento deve ter ou deve ser tutela do Judiciário e não de uma lei”, avaliou.

Carla acredita que a lei paulista não enfrenta a raiz do problema e transmite a falsa ideia de que o município está zelando pelas mulheres vítimas de violência. “Quisesse realmente fazer algo que fosse efetivo, teria criado uma lei de incentivo à contratação de mulheres”, disse. “Primeiro, o trabalho é um direito fundamental assegurado pela Constituição em vigor. Segundo, há vários casos de violência doméstica que têm como pano de fundo a dificuldade econômica na manutenção do lar, o que se agrava com a redução da oferta de trabalho e, certamente, recairá sobre a mulher o sustento exclusivo dos filhos”, explica.

O terceiro ponto levantado por Carla é que essa lei não ajuda na ruptura da dependência econômica da mulher em relação ao agressor e mascara, o que, efetivamente, é o objetivo da Lei Maria da Penha. "É mais uma daquelas medidas que podem parecer ‘justas’ no primeiro momento, mas que são verdadeiras ‘armadilhas’ que agravam ainda mais o problema”, acrescentou.

A Prefeitura de São Paulo foi procurada e não se posicionou sobre os questionamentos dos especialistas.

Formou-se em jornalismo pela PUC Minas e trabalhou como repórter do caderno de Gerais do jornal Estado de Minas. Na Itatiaia, cobre principalmente Cidades, Brasil e Mundo.