Um novo estudo realizado nos principais centros urbanos da Amazônia, abrangendo seis estados e 17 municípios, revela que os peixes da região estão contaminados por mercúrio. Os resultados mostram que peixes de todos os seis estados amazônicos apresentaram níveis de contaminação acima do limite aceitável (maior ou igual a 0,5 µg/g), estabelecido pela Organização Mundial da Saúde (OMS). O levantamento, divulgado nessa segunda-feira (29), foi realizado de março de 2021 a setembro de 2022 nos estados do Acre, Amapá, Amazonas, Pará, Rondônia e Roraima.
A ingestão diária de mercúrio excedeu a dose de referência recomendada em todas as pessoas que consumiram os peixes. No município mais crítico, de Rio Branco (AC), a ingestão de mercúrio ultrapassou de 6,9 a 31,5 vezes a dose de referência indicada pela Agência de Proteção Ambiental (EPA) do governo norteamericano (0,1 μg/kg pc/dia).
“As mulheres em idade fértil - público mais vulnerável aos efeitos do mercúrio – estariam ingerindo até nove vezes mais mercúrio do que a dose preconizada; enquanto crianças de 2 a 4 anos até 31 vezes mais do que o aconselhado”, detalha o relatório.
Em Roraima, segundo estado mais crítico, a potencial ingestão de mercúrio extrapolou de 5,9 a 27,2 vezes a dose de referência.
“Considerando os estratos populacionais mais vulneráveis à contaminação, mulheres em idade fértil estariam ingerindo até 8 vezes mais mercúrio do que a dose indicada, e crianças de 2 a 4 anos até 27 vezes mais do que o recomendado.”
Os piores índices, de acordo com o estudo, estão em Roraima, com 40% de peixes com mercúrio acima do limite recomendado, e Acre, com 35,9%. Já os menores indicadores estão no Pará, com 15,8%, e no Amapá, com 11,4%. Na média, 21,3% dos peixes comercializados nas localidades e que chegam à mesa das famílias na região Amazônica têm níveis de mercúrio acima dos limites seguros.
O resultado faz parte de um estudo realizado por pesquisadores da Escola Nacional de Saúde Pública Sergio Arouca (Ensp/Fiocruz), da Universidade Federal do Oeste do Pará (Ufopa), do Greenpeace Brasil, do Instituo de Pesquisa e Formação Indígena (Iepé), do Instituto Socioambiental e do Fundo Mundial para a Natureza (WWF-Brasil).
Estudo
O levantamento buscou avaliar o risco à saúde humana em função do consumo de peixes contaminados e visitou mercados e feiras em 17 cidades amazônicas onde foram compradas as amostras utilizadas na pesquisa.
“Este é o primeiro estudo que avalia os principais centros urbanos amazônicos espalhados em seis estados. Ele reforça um alerta para um assunto já conhecido, mas não resolvido, que é o risco à segurança alimentar na região amazônica gerado pelo uso de mercúrio na atividade garimpeira. É preocupante que a principal fonte de proteína do território, se ingerida sem controle, provoque danos à saúde por estar contaminada”, ressalta Decio Yokota, coordenador do Programa de Gestão da Informação do Iepé.
“Estamos diante de um problema de saúde pública. Sabemos que a contaminação é mais grave para as mulheres grávidas, já que o feto pode sofrer distúrbios neurológicos, danos aos rins e ao sistema cardiovascular. Já as crianças podem apresentar dificuldades motoras e cognitivas, incluindo problemas na fala e no processo de aprendizagem. De forma geral, os efeitos são perigosos, muitas vezes irreversíveis, os sintomas podem aparecer após meses ou anos seguidos de exposição. É urgente a criação de políticas públicas para atender as pessoas já afetadas pela contaminação por mercúrio e medidas preventivas, de controle de uso”, alerta Paulo Basta, pesquisador da Ensp/Fiocruz.