Uma análise sobre a concentração espacial da produção agropecuária revela uma reconfiguração das principais regiões produtoras do país desde os anos 2000. Disponível na plataforma de dados
A cana-de-açúcar é um exemplo de cultura cuja produção cresceu e incluiu novas áreas entre as principais. A plataforma da Embrapa mostra, ano a ano, quais microrregiões sozinhas respondiam por 25% da produção nacional e compunham o chamado Grupo 25 (G25).
Em 2000, esse grupo era composto por seis microrregiões: Araraquara, Jaboticabal, Jaú, Ribeirão Preto e São Joaquim da Barra, em São Paulo; e São Miguel dos Campos, em Alagoas. Em 2023, São Miguel dos Campos e Jaú saíram desse conjunto, embora esta última região tenha aumentado sua produção em quase 30%. Quatro novas microrregiões passaram a integrar o grupo de destaque na produção nacional: Presidente Prudente (SP), São José do Rio Preto (SP), Sudoeste de Goiás (GO) e Uberaba (MG).
Ao ampliar a análise, por meio do SITE-MLog, para analisar as microrregiões que respondiam por metade da produção (G50), os mapas demonstram diferenças ainda maiores. Em 2000, além da concentração em São Paulo, havia um grupo de microrregiões no Nordeste. Em 2023, estavam todas em São Paulo ou em regiões muito próximas em outros três estados: Minas Gerais, Goiás e Mato Grosso do Sul.
Deslocamento da produção
A produção de laranjas manteve-se concentrada principalmente no estado de São Paulo, mas o G25 mudou. Em 2000, Araraquara, Jaboticabal e São José do Rio Preto eram as microrregiões que concentravam 25% da produção nacional. Houve declínio na produção dessas três microrregiões e, em 2023, Avaré, Bauru, Botucatu e São João da Boa Vista assumiram a liderança na produção.
“As alterações da concentração espacial das áreas de produção estão muito vinculadas à incidência da doença do greening, o que tem causado perdas gradativas nos volumes produzidos nas regiões tradicionais e o crescimento em novas áreas”, observou o analista André Farias, da Embrapa Territorial. As safras de laranja mantiveram-se estáveis no período. Apesar da queda na área dos pomares, o aumento da produtividade garantiu o volume das colheitas.
Uma situação diferente aconteceu com a cana-de-açúcar. “Nesse caso, a cultura dobrou o volume nacional produzido entre 2000 e 2023, com o crescimento da produção em novas áreas, associado ao incremento moderado das regiões tradicionais. Para a cana, portanto, a concentração se altera não porque regiões tradicionais apresentam quedas acentuadas nos volumes produzidos, mas sim pelo fato de a cultura ter se expandido fortemente para outras áreas do território nacional, principalmente Goiás e Mato Grosso do Sul”, explicou.
Soja, milho e algodão
A produção de soja cresceu e se expandiu pelo território nacional. A concentração diminuiu, mas regiões com forte produção em 2000 permaneceram entre as de maior destaque. Naquele ano, Parecis (MT), Alto Teles Pires (MT), Barreiras (BA) e Sudoeste de Goiás (GO) respondiam por 25% da produção nacional. Em 2023, a fatia passou a ser dividida com Canarana (MT) e Dourados (MS).
“A soja continua se expandido como a cultura de primeira escolha para as safras de verão em diversas regiões do Brasil. Além de apresentar crescimento moderado nas regiões tradicionais, a cultura ainda tem se propagado significativamente na região do Matopiba, no norte do Mato Grosso, no estado do Pará e na metade sul do Rio Grande do Sul. Nesse caso, portanto, a diminuição da concentração é motivada pela abertura de novas frentes de expansão da cultura no território”, afirmou o analista. Essa disseminação se deu principalmente sobre áreas de pastagens degradadas.
A produção de milho também cresceu, mas fez o caminho contrário da soja e se concentrou em regiões já tradicionais. Em 2000, 13 microrregiões, em sete estados, somavam 25% da colheita. Em 2023, mesmo essa fatia da produção tendo aumentado de 8 para 34,9 milhões de toneladas, concentrou-se em apenas quatro microrregiões, todas no Centro-Oeste: Alto Teles Pires (MT), Sinop (MT), Sudoeste de Goiás (GO) e Dourados (MS). Destas, apenas Sinop não estava no grupo no ano 2000.
“As alterações na concentração espacial observadas no milho estão muito vinculadas ao fortalecimento da cultura como alternativa de segunda safra nos sistemas de produção com soja, principalmente no Mato Grosso”, explicou Farias.
Entretanto, nenhuma cultura é tão concentrada quanto o algodão. Em 2023, a região de Parecis (MT) respondia sozinha por 25% da produção nacional. Antes, em 2020, o G25 era dividido também com Primavera do Leste e Rondonópolis, MT, o que também mostrava alta concentração.
As mudanças na distribuição da produção impactam a logística e mobilizam diferentes instituições. “Regiões que enfrentam o declínio de uma atividade agropecuária estratégica para sua economia tendem a sofrer impactos socioeconômicos significativos, exigindo esforços de adaptação”, ressaltou Farias.
A ascensão de um segmento traz outros desafios. “Exigirá obrigatoriamente novas demandas de armazéns, de serviços de controle de pragas e doenças, de serviços financeiros, de rotas de transporte e alternativas para escoamento, de serviços técnicos para comercialização, entre outras atividades que integram o ecossistema econômico. Sem a adequada coordenação desses processos, os gargalos em diferentes etapas produtivas tendem a ficar visíveis e reduzirem substancialmente os ganhos”, acrescentou o analista.