O relançamento do PAA (Programa de Aquisição de Alimentos), que destina a produção da agricultura familiar a pessoas em situação de insegurança alimentar tem dividido opiniões. Desde 2003, o governo paga até 30% a mais por produtos orgânicos. Neste ano, já foi autorizada a compra de mil toneladas produzidas por 309 agricultores em Pernambuco. Desses, 32 cultivam organicamente hortaliças como pimenta, alface, batata doce e milho. Ao todo, o governo comprará levas de 15 alimentos produzidos pela Agroflor.
Para o produtor de orgânicos de Capim Branco, região metropolitana de Belo Horizonte, Lucas Souza, programas como o PNAE e PAA são muito restritivos por excluírem agricultores não familiares. “E pra você se enquadrar como agricultor familiar, pra você ter acesso ao documento que é o Cadastro de Agricultura Familiar - CAFE - também há muitas restrições. Para se ter uma ideia, na área de horticultura, o produtor só pode ter, no máximo, dois funcionários com carteira assinada. Não se leva em consideração o fato de ser uma atividade que requer grande de mão de obra”.
Souza conta que tem uma área pequena (10 hectares de horta e outros 10 hectares para produção de milho crioulo) e não é considerado agricultor familiar aos olhos do estado. Isso significa, segundo ele, que, na prática, só os micro produtores têm acesso a esses programas ou, então, aqueles que encontram meios de burlar a lei para ter acesso ao documento e, consequentemente, aos programas.
A principal consequência na região, de acordo com o produtor, é a desistência de vários produtores. “Tem vários produtores da área de agricultura orgânica parando de produzir. Na verdade, o segmento como um todo está passando por um momento muito difícil. Acredito que, com a retomada do PNAE e PAA, a gente ganhe um fôlego. Esses programas são muito importantes”, disse.
Meio milhão serão destinados ao programa
Em 2023, o Governo Federal reservará R$ 500 milhões ao programa, segundo o MDA (Ministério do Desenvolvimento Agrário e Agricultura Familiar). Em comparação, foram R$ 350 milhões em 2003; R$ 600 milhões em 2015; e R$ 53 milhões em 2019. Os valores consideram a inflação.
A secretária de Política Agrícola da Contag (Confederação Nacional dos Trabalhadores na Agricultura) Vânia Marques Pinto, reconheceu, em entrevista ao jornal Folha de São Paulo, que centenas de pequenos produtores de alimentos orgânicos não conseguem a documentação necessária para comprovar a qualidade ou o próprio status de agricultor familiar.
A burocracia se reflete também na dificuldade em quantificar o tamanho do mercado de orgânicos do país. Não há dados oficiais do setor, e as únicas estimativas são feitas pela Organis, associação privada que promove o tema.
Segundo a organização, o mercado cresceu entre 6% e 9% em 2022 —nos últimos dois anos, a alta foi de 12% e 30%, respectivamente, motivados pela pandemia de Covid-19, que mudou os hábitos alimentares das classes mais ricas do Brasil.
Entre 2012 e março de 2023, o número de agricultores familiares passou de 6.000 para aproximadamente 25 mil, de acordo com o Cadastro Nacional de Produtores Orgânicos.
O dirigente de produção do MST, Diego Moreira, sugere que o Governo Federal crie um
A pasta também informou estar conversando com o Banco Interamericano de Desenvolvimento para destinar o equivalente a R$ 1,3 bilhão à agricultura familiar. Detalhes ainda não foram divulgados.
Em outra linha, o BNDES (Banco Nacional do Desenvolvimento Econômico e Social), responsável por 15% dos créditos da agricultura familiar, divulgou recentemente a captação de US$ 202,5 milhões (R$ 1 bilhão) com o Fundo Internacional de Desenvolvimento Agrícola.
Para Lucas Souza, da Vista Alegre Orgânicos, o ideal seria que existissem programas de crédito subsidiados, como o PRONAF, só que específico para a agricultura familiar. “Quem é agricultor orgânico deveria ter acesso a crédito diferenciado porque oferece retorno social é gigantesco. Evitamos. por exemplo, gastos governamentais com a despoluição das águas, ao não utilizarmos nenhum tipo de defensivos agrícolas. No entanto, estamos, desde outubro do ano passado, tentando acesso a crédito rural e não conseguimos porque os bancos estão todos sem linha. Eu não sei se é resquício do governo passado ou se ainda não deu tempo de entrar na política nova. Fato é que a burocracia está grande”.