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Dia do Sexo: Ouça músicas brasileiras cheias de sensualidade e erotismo

Desde 2008, o 6 de setembro é conhecido no Brasil como Dia do Sexo, em maliciosa alusão à posição sexual conhecida como 69

Roberto de Carvalho e Rita Lee, além de casados, compuseram algumas das músicas mais sensuais do Brasil

Desde 2008, o 6 de setembro é conhecido no Brasil como Dia do Sexo, numa alusão maliciosa à posição sexual conhecida como 69, que envolve sexo oral das duas partes envolvidas. Claro que esse tema que sempre gera comoção também foi abordado pelos compositores da música brasileira, desde os anos 1950 até hoje, passando por ritmos diversos como a valsa, o twist, a balada, o rock e a música pop, numa lista que agrega de Ney Matogrosso a Celly Campello, passando por Chico Buarque, Elza Soares, Caetano Veloso e Duda Beat, com muita sensualidade, libido e erotismo.

“Amendoim Torradinho” (valsa, 1955) – Henrique Beltrão

Não é por acaso que a valsa “Amendoim torradinho”, de 1955, recebeu esse ritmo. O langor da melodia atende perfeitamente aos versos que procuram captar o prazer que um corpo é capaz de oferecer a outro, ou a perturbação que emite.

Composta por Henrique Beltrão, a música foi lançada por Vera Lúcia, e regravada por Sylvia Telles, Ângela Maria, Waleska, Marília Pêra, e muitas outras mulheres, sempre em interpretações derramadas. Ivon Curi, ao contrário, salpicou a canção com suas malícias pontuais.

Mas foi Ney Matogrosso quem garantiu ao tema sua mais provocativa conotação, ao derramar sobre a música a libido e sensualidade híbrida de sua personagem.

“Banho de Lua” (twist, 1960) – versão de Fred Jorge

Celly Campello lançou em 1960 uma versão escrita por Fred Jorge que ampliou ainda mais o seu enorme sucesso àquela altura. Precursora do rock feito para a juventude, depois apelidado por “Jovem Guarda”, a musa dos adolescentes da década de 1950 e início dos anos 1960, sempre cantou músicas que aludiam ao corpo feminino e à sensualidade de maneira disfarçada.

Em “Banho de Lua” não acontece o contrário, embora sem citar nominalmente nenhuma parte do corpo é possível imaginá-lo, em sua plenitude e à escolha do ouvinte, pela palavra banho. A maneira leve de cantar, perpassada por gemidos cheios de inocência aparente, completam esse cenário.

“Pérola Negra” (MPB, 1971) – Luiz Melodia

Luiz Melodia compôs “Pérola Negra” em 1969, quando tinha 18 anos, e a batizou de “My Black”. Descoberto no bairro do Estácio pelos poetas Torquato Neto e Wally Salomão, recebeu a sugestão de Wally de mudar o nome da música para “Pérola Negra”, que era o “nome de guerra” de uma travesti que Wally conhecia.

Foi também Wally quem levou a música para Gal Costa lançar em 1971, no show “FA-TAL: Gal a Todo Vapor”, tornando-se a primeira mulher a cantar, com sucesso de dimensões nacionais, a palavra “sexo” na música brasileira: “Tente entender tudo mais sobre o sexo”, sugeria o refrão da canção.

“Cavalgada” (balada, 1977) – Roberto Carlos e Erasmo Carlos

“Cavalgada” é uma das músicas mais ousadas do repertório de Roberto e Erasmo Carlos, lançada pelo Rei em 1977, no disco de capa alaranjada, em que a luz do refletor imitava um sol. A partir de metáforas, Roberto e Erasmo descrevem uma relação sexual, sem perder o romantismo.

Essa receita equilibrada gerou imagens poderosas, como “usar meus beijos como açoite” e “vou me deitar no seu cansaço”. A música ganhou regravação da dupla Bruno & Marrone, e gerou um dueto entre Erasmo e Maria Bethânia que é de arrepiar. A música fala sobre uma intensa relação sexual.

“Mania de Você” (balada, 1979) – Rita Lee e Roberto de Carvalho

Quando Carmen Miranda brincou com o duplo sentido na carnavalesca “Eu Dei”, de 1937, ela teve que se valer dos versos de Ary Barroso.

O mesmo aconteceu com a cantora portuguesa Vera Lúcia, primeira intérprete da lânguida e sensual “Amendoim Torradinho”, obra de Henrique Beltrão lançada por ela em 1955, e que depois ganhou as vozes de Ney Matogrosso, Angela Maria, Alcione, Dóris Monteiro e Ivon Curi, entre outros.

O fato ainda era comum no ano em que Maria Bethânia gravou, “O Meu Amor”, de Chico Buarque, em 1978. Rita Lee avançou nessa questão com a sensualíssima “Mania de Você”, balada composta com o marido Roberto de Carvalho, em 1979.

“Eu Te Amo” (MPB, 1980) – Chico Buarque e Tom Jobim

Também ao lado de Tom Jobim, em outra parceria consagrada, Chico Buarque escreveu, em 1980, os versos para a música “Eu te amo”, incluída no rol dos maiores sucessos da MPB. A música serviu como trilha sonora para o filme de mesmo nome dirigido por Arnaldo Jabor um ano depois, protagonizado por Sônia Braga e Paulo César Pereio.

Com sua habitual habilidade poética Chico conduz o ouvinte pelos meandros da relação a dois, em suas desavenças e reencontros, que tem no corpo o espaço em que se infiltra e explode, e combinou imagens de pura sensualidade a lamentos típicos da dor de cotovelo. “Se na bagunça do teu coração (…)/Teus seios inda estão nas minhas mãos…”.

“Nosso Estranho Amor” (balada, 1980) – Caetano Veloso

Independente em relação ao estilo e declaradamente apaixonada pelo suingue presenciado em Seu Jorge – “fico louca com isso!” –, Marina deixou-se cair indolentemente nos braços tropicais e revolucionários de Caetano Veloso, Maria Bethânia, Gilberto Gil e Gal Costa. Todos lhe dedicaram músicas e gravaram sucessos de sua autoria. Segundo Lobão, a laureada com “Nosso Estranho Amor”, de Caetano, teria sido “adotada pelo movimento”.

“Pra mim foi muito importante, pois de certa maneira recebi aval e prestígio”. As “pontes”, nas próprias palavras, estabelecedoras da união, teriam sido “o reconhecimento de uma originalidade, só posso entender assim, por ambos os lados”, orgulha-se. Em 1980, ela lançou a bela balada “Nosso Estranho Amor”.

“Paixão” (balada, 1981) – Kledir Ramil

A tradição romântica marca a música brasileira desde o seu princípio, com valsas e boleros eternizados por nomes como Carlos Galhardo, Francisco Alves e outros apaixonados do gênero.

Os primeiros ritmos com acento nacional, como as serestas e o samba-canção, também seguiram esse estilo, destacando cantoras cuja entrega era possível sentir nas letras e interpretações, casos de Dolores Duran, Dalva de Oliveira e, mais à frente, Maysa.

Já a sensualidade aparece menos frequentemente, embora marque a balada “Paixão”, composta por Kledir Ramil, em 1981, regravada por Claudia Leitte. A música traz o inesquecível verso: “Ah, esse maldito fecheclair…”.

“Me Deixas Louca” (bolero, 1981) – versão de Paulo Coelho

Bolero do mexicano Armando Manzanero, vertido para o português por Paulo Coelho, “Me Deixas Louca” é uma daquelas músicas que se ajustavam à emoção precisa para que Elis Regina transbordasse, em cena, todo o seu talento para arrebatamentos amorosos.

A música entrou para a trilha da novela global “Brilhante”, de Gilberto Braga, Euclydes Marinho e Leonor Bassères e foi tema do casal formado por Vera Fischer e Tarcísio Meira. Elis não chegou a registrá-la em disco, pois morreu precocemente em 1982, aos 36 anos, vítima de uma mistura fatal de uísque e cocaína. Ainda assim, a música se tornou um dos maiores sucessos da carreira da Pimentinha e foi regravada por Maria Rita.

“Simples Carinho” (samba-canção, 1982) – João Donato e Abel Silva

Intérprete do sucesso “Simples Carinho” (parceria de João Donato e Abel Silva), Angela Ro Ro conta, aos risos, em seu documentário “Eu Sou Insana?”, que certa feita teve de “fugir de um João Donato excitado”. “Essa história é só brincadeira dela, Ro Ro é impossível”, garante o pai de Donatinho.

A música foi lançada em 1982, no disco de mesmo nome, em que a cantora aparecia na colorida capa com um papagaio na mão e os cabelos e o corpo molhados pela água onde ela está imersa. “Simples Carinho” tornou-se um dos maiores sucessos da carreira de Angela Ro Ro e parte indispensável de seu repertório.

“Todo Amor Que Houver Nessa Vida” (rock, 1982) – Cazuza e Roberto Frejat

Em “Todo Amor Que Houver Nessa Vida”, lançada pelo grupo “Barão Vermelho” em seu disco de estreia, no ano de 1982, Cazuza delimita bem os espaços de conflito entre o corpo e a mente.

Na ânsia de possuir o parceiro em toda a sua plenitude, agilmente faz uma ressalva. “E se eu achar a tua fonte escondida/ Te alcanço em cheio o mel e a ferida/ E o corpo inteiro feito um furacão/ Boca, nuca, mão, e a tua mente não”.

E completa a metáfora com mais uma imagem poderosa que liga o corpo aos prazeres da carne. “Ser teu pão, ser tua comida”. Lançada como um rock, foi regravada por Caetano Veloso em clima menos hostil, mais sereno, incorporado na gravação solo de Cazuza em 1988.

“Como Dois Animais” (balada, 1982) – Alceu Valença

Para exprimir as delícias e promessas de prazer que lhe causa o corpo feminino e sua imagem, Alceu Valença adere ao universo das frutas, no forró composto em parceria com Vicente Barreto em 1982. “Morena Tropicana” consolidou-se como um dos maiores êxitos da carreira do compositor pernambucano.

O rico e diverso cenário cultural brasileiro, na cor e exuberância das frutas, é utilizado com maestria nas metáforas que pincelam a imagem da musa. As palavras são nitidamente escolhidas pelo desejo e sensualidade que exprimem através de seu som, num ensinamento da poesia simbolista incorporada por Alceu Valença aos costumes e sotaques nacionais.

Noutra toada, mantendo a sensualidade, Alceu Valença abordou o sexo de maneira alegórica na música “Como Dois Animais”, lançada no disco “Cavalo de Pau”, de 1982, e que superou as 500 mil cópias vendidas.

“Vitoriosa” (balada, 1985) – Ivan Lins e Vítor Martins

Em 1974, Ivan Lins e Vítor Martins iniciaram uma das mais bem-sucedidas parcerias da MPB. E foi, justamente, com a música “Abre Alas”, que assim os apresentava para o rol de sucessos da música brasileira.

Já em 1985, Vítor Martins e Ivan Lins provocaram outra mudança comportamental ao abordar o prazer feminino de maneira direita e lírica: “Quero sua alegria escandalosa/ Vitoriosa por não ter/ Vergonha de aprender como se goza”. E “Vitoriosa” virou trilha da novela “Roque Santeiro”.

“Tango de Nancy” (tango, 1985) – Chico Buarque e Edu Lobo

“Tango de Nancy” é outra música de Chico Buarque feita sob encomenda, desta vez para o espetáculo teatral “O Corsário do Rei”, de Augusto Boal. Escrita em parceria com Edu Lobo, como toda a trilha da peça, “Tango de Nancy” se destaca pelo caráter visceral e extremo. A atividade da prostituição é descrita em seus aspectos mais dramáticos, passionais e simbólicos.

É das poucas canções brasileiras a aludirem ao sexo de forma tão direta, livre e poética. O clima, no entanto, assume uma esfera triste, pois pesa sobre a protagonista a escolha feita por necessidades e não prazer.

Essa realidade, substituída ao longo dos anos em alguma medida, é recorrente artisticamente, o que entrega a sua ocorrência na vida. O tango foi lançado em 1985 por Lucinha Lins, no espetáculo, e regravado por Célia, Elba Ramalho, e pelo próprio Chico Buarque.

“4 Semanas de Amor” (balada, 1990) – versão de Carlos Colla

Trinta anos depois de ter sido lançada, a música “Sealed with a Kiss”, de Peter Udell e Gary Geld, ganhou uma versão de Carlos Colla que fez enorme sucesso na novela “Gente Fina”, exibida em 1990 na Rede Globo.

“4 Semanas de Amor” foi lançada pela dupla Luan e Vanessa, que também formava um casal. Atualmente, eles trabalham com música gospel e moram nos Estados Unidos, e gravaram, durante a quarentena de 2020, uma nova versão para “4 Semanas de Amor”. A música também foi regravada pela dupla As Marcianas…

“Palpite” (balada, 1997) – Vanessa Rangel

Carioca, a cantora Vanessa Rangel lançou apenas dois discos. Mas foi com o primeiro que ela colocou definitivamente o seu nome na história da música brasileira, graças à balada “Palpite”. A romântica canção entrou na trilha da novela “Por Amor”, da Rede Globo, no mesmo ano de 1997 em que ela foi lançada, o que contribuiu para ampliar ainda mais o seu sucesso. Regravada por Adriana Calcanhotto, a música passou a ser associada à banda Kid Abelha, pela semelhança de timbres entre Vanessa Rangel e a vocalista Paula Toller…

“Façamos [Vamos Amar]” (jazz, 2000) – Cole Porter em versão de Carlos Rennó

No primeiro ano do novo milênio, o letrista, produtor e jornalista Carlos Rennó colocou na praça um projeto ousado: músicas de Cole Porter e George Gershwin, dois dos maiores estandartes do jazz norte-americano, traduzidas para o português em versões interpretadas por Caetano Veloso, Gilberto Gil, Chico Buarque, Mônica Salmaso, Jussara Silveira, entre outros. Coube a Elza Soares, com sua voz elástica, cantar as artimanhas sensuais da irresistível balada “Façamos (Vamos Amar)”, ciceroneada pelo compositor Chico Buarque.

“Amor e Sexo” (balada, 2003) – Rita Lee, Arnaldo Jabor e Roberto de Carvalho

Uma contribuição fundamental de Rita Lee diz respeito ao discurso libertário e feminista, em músicas cheias de sensualidade como “Doce Vampiro”, “Caso Sério”, “Banho de Espuma” e “Cor de Rosa-Choque”, que colocavam a mulher em primeiro plano. Ela também prestou reverência a ícones da liberdade nacional, como a jornalista Pagu e a vedete Elvira Pagã. Já em 2003, Rita conheceu o sucesso junto a uma nova geração, quando musicou uma crônica de Arnaldo Jabor, “Amor e Sexo”, que recolocou o seu nome em destaque nas rádios. Até hoje, a balada é cantada a plenos pulmões.

“Ficou na Saudade” (choro-tango, 2016) – Waldir Silva, Raphael Vidigal e André Figueiredo

Se o poeta a tem em seus sonhos, de Oswald de Andrade a Aldir Blanc, não é por acaso que a prostituta merece destaque na nossa canção. E para não dar espaço à monocromia, embora timidamente, Zé Ramalho dá luz aos homens que desempenham igual profissão.

Ao longo das décadas essa atividade foi descrita, cantada, e logo, vivenciada, por Noel Rosa, Nelson Gonçalves, Gal Costa, Trio Parada Dura, Odair José, e outros, com diferenças de abordagem e um enorme poder de identificação junto ao público. O choro em forma de tango “Ficou na Saudade”, de Waldir Silva, Raphael Vidigal e André Figueiredo, aborda a relação tempestuosa com uma cortesã.

“Tangerina” (MPB, 2019) – Tiago Iorc e Roberto Pollo

“Tangerina” foi lançada por Tiago Iorc no álbum “Reconstrução”, o quinto de estúdio da carreira do brasiliense, em maio de 2019, mas ganhou fama e caiu no gosto do público depois de ter sido incluída no bem-sucedido projeto “Acústico MTV”, do mesmo ano, e contar com a participação da cantora pernambucana Duda Beat, que se inspirou para que tudo se encaixasse perfeitamente.

Além da voz afinada, Duda gesticulou bem, dançou e mostrou toda a sensualidade da letra. O toque final foi dado com o vestido volumoso da intérprete, na cor tangerina.

O clima intimista criado para o lançamento acústico deu outro tom à canção, e a participação do guitarrista Mateus Asato trouxe ainda mais genialidade à gravação. Atualmente, o registro de “Tangerina” no YouTube supera 30 milhões de visualizações. “Chega, bem devagar/ Calma, só me beija/ Cala, minha boca”, dizem os versos iniciais.