Minas Gerais é uma das terras mais musicais do Brasil, dando frutos como os compositores Ary Barroso, Geraldo Pereira, João Bosco, e tantos outros, que construíram a carreira no Rio de Janeiro, então meca da cultura nacional, além da cantora Clara Nunes, que iniciou a carreira na rádio Inconfidência, e de ter acolhido Milton Nascimento e seu Clube da Esquina, que aqui criaram uma obra de forte influência barroca.
Por conta disso, o Estado, como não poderia deixar de ser, foi cantado em verso e prosa ao longo das décadas, passando por ritmos diversos como a toada, a valsa, o samba e a moda de viola, mantendo a beleza de uma região cercada por montanhas, e que respira arte...
“Ó Minas Gerais” (valsa, 1942) – José Duduca de Moraes e Manoel Araújo
Em 1942, o compositor mineiro José Duduca de Moraes registrou pela primeira vez em disco a canção que viria a se tornar hino de Minas Gerais, ainda que de maneira informal.
“Ó Minas Gerais” era uma valsa adaptada por ele e seu parceiro Manoel de Araújo de uma tradicional sinfonia italiana, que, por sua vez, inspirara o hino oficial da cidade de La Paz, na Bolívia.
Admirando as montanhas de Minas Gerais, Duduca compôs os versos que se entranhariam de tal maneira ao imaginário popular a ponto de serem considerados de domínio público.
Antes, em 1912, o palhaço negro Eduardo das Neves, criara outra canção com o mesmo nome, em honra e glória do encouraçado marítimo batizado de “Minas Gerais”. Ao longo das décadas vários músicos deram voz ao hino das Minas Gerais, como Milton Nascimento, e diversos corais mineiros.
“Chico Mineiro” (toada, 1945) – Tonico e Francisco Ribeiro
Uma declamação introduz a história do folclórico “Chico Mineiro”, personagem dessa toada composta, em 1945, por Tonico, da dupla sertaneja com Tinoco, e Francisco Ribeiro.
A música foi lançada, justamente, por Tonico & Tinoco, antes de receber uma centena de gravações, em que se destacam as de Rolando Boldrin, Sérgio Reis, Inezita Barroso e a das Irmãs Galvão.
Embora mineiro, o personagem do título ruma para Goiás, numa daquelas andanças típicas que se tornaram moda entre os sertanejos à procura de oportunidade de trabalho e de uma vida mais digna no campo.
Cabe lembrar que a dupla paulista formada por Tonico & Tinoco é a mais importante da música sertaneja em termos de vendagem de discos. Juntos de 1930 a 1994, é incontável o número de álbuns colocados no mercado pelos intérpretes, e que superam 50 milhões de cópias.
“Exaltação a Tiradentes” (samba-enredo, 1949) – Mano Décio da Viola, Estanislau Silva e Penteado
“Exaltação a Tiradentes” nasceu de um sonho do sambista Mano Décio da Viola, que agregou aos versos recebidos durante a noite, outros propostos por Estanislau Silva e Penteado.
Antes da consagração, Décio e Silas de Oliveira haviam oferecido três sambas com o mesmo tema para a Escola de Samba do Império Serrano.
Passada a frustração, a música foi cantada na avenida em 1949, mas só chegou ao disco em 1955, na gravação de Roberto Silva. Outros intérpretes não menos tarimbados a registraram posteriormente, dentre os quais Jorge Goulart com seu vozeirão e a irrepreensível Elis Regina, além de Maria Creuza, Cauby Peixoto e Mestre Marçal.
Pioneiro, como o seu inspirador, é considerado o primeiro samba-enredo a ultrapassar os limites carnavalescos, contando a história do mártir da Inconfidência Mineira, um marco para o Estado.
“Fantasia de Minas Gerais” (samba-enredo, 1958) – Delê e Tand
Ary Barroso, mineiro de Ubá, era cobrado por criar canções exaltando o Rio de Janeiro e a Bahia e não dedicar nenhuma linha melódica a seus conterrâneos. Foi como uma resposta ao compositor de “Aquarela do Brasil” que a dupla formada por Delê e Tand compôs, em 1958, o samba-enredo “Fantasia de Minas Gerais”, lançado naquele mesmo ano pelo cantor Gilberto Santana em um disco de 78 rotações. Posteriormente, os também mineiros Agnaldo Timóteo e Acir Antão voltariam a essa bela peça, fruto de uma provocação, como deixa claro nos versos de abertura. E Belo Horizonte também é exaltada.
“Minas Gerais” (moda de viola, 1961) – Tião Carreiro e Pardinho
Nascido em Monte Azul, no interior de Minas Gerais, Tião Carreiro formou com Pardinho, paulista de São Carlos, em meados da década de 1950, uma das mais conhecidas e admiradas duplas caipiras de todo o Brasil.
Habituados a gravarem gêneros tradicionais como o cateretê e o pagode de viola, ligados às nossas origens indígenas e africanas, os dois compuseram, em 1961, um de seus maiores sucessos, a comovente e enaltecedora moda de viola “Minas Gerais”, que se alastrou pelo Brasil com a força da sua beleza.
A canção seria regravada, nos anos 2000, pelo cantor Daniel, quando já gozava de prestígio tanto junto ao povo quanto com os aficionados pela música que fala do campo.
“Para Lennon e McCartney” (clube da esquina, 1970) – Lô Borges, Márcio Borges e Fernando Brant
“Márcio (Borges), Lô (Borges) e Fernando (Brant)... Posso definir os três numa só palavra: coração. E o que eles trouxeram de único para mim e para minha vida é uma coisa chamada amizade. Isso sim é uma das coisas mais importantes na minha vida. Sem amizade não consigo fazer nada, nem atravessar a rua”.
A afirmação é de Milton Nascimento que, entre os amigos, sempre foi intimamente chamado de Bituca, e, em 1970, lançou uma parceria do trio que se tornou um de seus grandes sucessos.
“Para Lennon e McCartney” explicitava no título a influência dos Beatles sobre o Clube da Esquina, mas deixava claro em seu verso final: “Sou do mundo/ Sou Minas Gerais”. A música ganhou uma regravação da cantora Célia, no ano de 1971.
“Guerreira” (samba, 1978) – João Nogueira e Paulo César Pinheiro
A mineira Clara Nunes, natural de Caetanópolis, no interior do Estado, foi, sem dúvida alguma, a principal voz do sincretismo religioso no Brasil. Ao aderir à umbanda e ao candomblé, cravou sua marca no samba de tantas intérpretes e interpretações.
Além dos adereços, das danças, e do cabelo, Clara se portava como uma autêntica filha da influência africana no país. E interpretava as músicas com esse sentimento.
A mineira guerreira, lutadora ativa das lutas sociais, sempre a favor do meio ambiente e das práticas religiosas enraizadas na origem do Brasil, não se fez de rogada ao entoar, em 1978, o samba “Guerreira”, que João Nogueira e o Paulo César Pinheiro compuseram em sua homenagem. A música se tornou uma das mais emblemáticas de seu repertório.
“Cabaré Mineiro” (valsa, 1980) – Tavinho Moura e Carlos Drummond de Andrade
Entre trilhas sonoras, títulos da discografia-solo e outros em parceria, o músico Tavinho Moura contabiliza 18 álbuns na carreira, sem contar as participações. Mineiro de Juiz de Fora, ele recolheu, em 1976, a música de domínio público “Calix Bento”, oriunda da folia de reis, que ele adaptou para ser lançada naquele ano por Milton Nascimento, com enorme repercussão.
Outra gravação de sucesso para a mesma música foi a da dupla caipira Pena Branca & Xavantinho. A canção desperta o histórico barroco e colonial das Minas Gerais. Já “Cabaré Mineiro” veio do filme homônimo, da década de 1980, quando foi interpretada por Tânia Alves.
A música é uma adaptação do poema de Carlos Drummond de Andrade, outro emblema da cultura mineira, e mescla beleza e estranhamento, num encontro que adensa as percepções sobre Minas Gerais...
“Minas ao Luar” (choro-valsa, 2012) – Waldir Silva, Raphael Vidigal e André Figueiredo
Choro lento, ao ritmo de uma valsa, “Minas ao Luar” foi composta pelo cavaquinhista mineiro Waldir Silva na década de 1970 para servir de prefixo musical ao evento que levava apresentações pelo interior de Minas.
Waldir não só participou da primeira edição do projeto de serenatas como dividiu o palco com ninguém menos do que Juscelino Kubistchek, figura ilustre da política brasileira, que ocupou o cargo de presidente do país.
Muitos anos depois, o instrumentista apresentou suas composições autorais para que o jornalista Raphael Vidigal colocasse letras, fato que aconteceu em 2012. Um ano depois, o músico faleceria, mas a iniciativa que começou ali culminaria com o lançamento do disco “Waldir Silva em Letra & Música”, em 2016. Na canção, composta com André Figueiredo, cidades mineiras são citadas nominalmente.
“Vila Rica” (folia de reis, 2021) – Ed Nasque
Quando ainda era conhecida como Vila Rica, a hoje histórica cidade de Ouro Preto foi denominada capital de Minas Gerais, para se ter uma dimensão de sua importância.
Patrimônio Histórico da Humanidade, as ladeiras de Ouro Preto são tão conhecidas quanto seu conjunto arquitetônico, formado, sobretudo, pela Igreja de São Francisco de Assis, que revela todo o talento do escultor Aleijadinho, e pela Matriz de Nossa Senhora do Pilar, que possui mais de 400 quilos de ouro em sua ornamentação.
A cidade teve sua história cantada em prosa e verso em “Vila Rica”, composição do mineiro Ed Nasque, formado em música pela Universidade Federal de Ouro Preto, nossa conhecidíssima UFOP. Ed resgata essa história da cidade com a sua veia lírica.