Francisco Egydio herdou estilo de Jamelão e inspirou Agnaldo Timóteo

Cantor e compositor paulistano nasceu no dia 17 de janeiro de 1927, cantou boleros e dedicou um álbum a Lupicínio Rodrigues

Francisco Egydio gravou músicas de Noel Rosa, Lupicínio Rodrigues, Dorival Caymmi, e outros astros da MPB

Francisco Egydio tinha voz talhada para o romantismo, com os gestos exagerados que ele expressava no palco, como uma espécie de precursor de Agnaldo Timóteo. Negro retinto de porte elegante, sempre alinhado, preferencialmente de terno e gravata, ele causava impressão na plateia, quanto mais no momento em que a voz, ao mesmo tempo grave e suave, ecoava. Impossível ficar indiferente diante de tal presença. Francisco Egydio tinha porte e pinta de galã. A primeira vez que ele apareceu foi cantando no rádio, reciclando sucessos de Nelson Gonçalves, Orlando Silva, Carlos Galhardo, etc.

A carreira teve que ser interrompida quando ele foi convocado para cumprir o serviço militar obrigatório, onde permaneceu por quatro anos e saiu como cabo da Aeronáutica. Nascido em São Paulo, em uma família de poucas posses, Francisco Egydio viu a sorte mudar ao tirar o primeiro lugar no concurso “O Cantor dos Bairros”, da rádio Excelsior, logo após abandonar a farda, recebendo como prêmio um contrato de experiência de três meses na emissora, que se tornou permanente na sequência. Em 1953, estreou em disco. A passional “Creio em Ti” deu a ele o ambicionado troféu Roquette Pinto.

O sucesso proporcionou excursões por países da África e Portugal, além de apresentações na América do Sul que incluíram Argentina, Uruguai e Paraguai. O primeiro álbum foi dividido com Roberto Paiva, no saboroso “Polêmica”, que resgatava os arranca-rabos entre Noel Rosa e Wilson Batista, com direito a capa desenhada por Antônio Nássara. Enquanto Paiva cantava as canções de Wilson, Egydio se incumbia das de Noel, mostrando que também tinha tino para o samba, embora sua praia fosse mesmo as canções doloridas, preferencialmente tangos, boleros, e sambas-canções. Ali que ele se deleitava.

Logo não foi surpreendente o encontro de Francisco Egydio com a obra de Lupicínio Rodrigues. Na capa do LP, lançado em 1962, os dois se cumprimentavam amistosamente, em uma imagem que entrou para a história. Ambos bem alinhados, vestindo ternos azuis, o de Egydio ainda mais chamativo, com um grande mural de Portinari atrás, revelando cabrochas dançando e tocando flauta. A arte da Odeon deixava claro a importância da empreitada. “Brasa”, “Nunca”, “Maria Rosa”, e outras preciosidades de Lupicínio, ganharam a voz de Francisco Egydio, ajustada às dores-de-cotovelo.

O passo seguinte foi investir nas próprias composições. A marcha “Bamboleando” alcançou alguma repercussão. Herdeiro do estilo de Jamelão, Francisco Egydio criou assinatura própria, mas, aos poucos, sentiu o ostracismo bater à porta. Com a ascendência da bossa nova, acabou posto de lado. Tentou a carreira como ator, participou de filmes e entrou para a trilha sonora da novela “Meu Rico Português”, da TV Tupi, em 1975, embora o seu destino parecesse já estar traçado. Em 1984, depois de quase uma década afastado dos estúdios, colocou na praça seu último LP, chamado “Esperança”.

Na capa, aparecia sorridente, bonito, galante. Duas estrelas vermelhas faziam as vezes de ponto sobre as letras de seu nome. O cantor que começou a carreira interpretando os sambas arrebatadores e derramados do repertório oriundo da era de ouro do rádio, agora se entregava a canções de Lulu Santos, Cartola, Dorival Caymmi, Martinha, dentre outros, mantendo a beleza do timbre metálico e a gravidade de uma voz cheia de ancestralidade. Francisco Egydio é uma dessas pérolas negras da canção popular brasileira, à espera de que novos escavadores do tesouro nacional venham resgatá-la. História não falta...

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