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Churrasquinho a R$ 2 com pinga de brinde tem o mesmo preço desde 2019: ‘Sambiquira ajuda’

Mesmo com reajuste de 60% em cinco anos, preço do churrasquinho não é reajustado

Sheila diz que muitos clientes compram churrasquinhos para colocar na marmita

É possível vender comida de qualidade e manter o preço por cinco anos? Sheila Rodrigues de Morais, de 41 anos, dona de uma barraca improvisada na entrada da Vila Bispo de Maura, no limite entre Belo Horizonte e Ribeirão das Neves, mostra que sim. Ela vende churrasquinho de pernil, filé de frango e de sambiquira (parte traseira do frango) a R$ 2 desde 2019 e garante não ter planos para reajustar o valor.

Mas qual é o segredo? Sheila diz que o valor e quantidade de espetinhos de sambiquira vendida por mês, cerca de meia tonelada, ajudam a segurar o preço.

“Tem 5 anos que vendo meus espetinhos a R$ 2. E o que me ajuda a manter esse preço é a sambiquira, que é uma carne que quase ninguém compra. Então, ela não tem aumento. Por isso, as pessoas não entendem por que ainda consigo manter a R$ 2. Hoje, o quilo está R$ 6,50. Vendo muita sambiquira, e menos porco e frango. Então, ganho no giro. E hoje, graças a Deus, não pago aluguel e não pago funcionário, o que ajuda muito”, disse a empreendedora, ressaltando que o preço do latão de uma marca famosa de cerveja também é o mesmo há cinco anos (R$ 5).

Sheila também leva em consideração, para manter o preço, o público e o lado social. “Seguro o preço a R$ 2 e não pretendo aumentar. Estou na entrada da vila e meus clientes são mais pessoas de baixa renda, que não têm acesso ao dinheiro. Pessoa que sai para trabalhar pela manhã, volta à noite e pega o espetinho para colocar na marmita e matar a fome mesmo. A gente vê que as pessoas não ficam mais muito tempo na barraca. Você percebe que o dinheiro diminuiu muito no bolso deles. Eles estão levando a sambiquira para colocar na marmita e para jantar”, reforça Sheila, conhecida como rainha da sambiquira e que foi personagem da primeira edição da série especial da Itatiaia Comida, Boteco e os Segredos de Belo Horizonte.

Sheila vende meia tonelada de sambiquira por mês

Sheila diz que, ao contrário da sambiquira, os preços do pernil e do filé de frango subiram muito nos últimos anos. E ela tem razão. Levantamento feito pelo site Mercado Mineiro a pedido da Itatiaia mostra que o preço do pernil sem osso saltou de R$ 12,99 e R$ 20,39 em 5 anos, aumento de 56,97%. No mesmo período, o quilo do filé de frango foi de R$ 8,64 para R$ 13,98, 61,81% mais caro. O site não faz pesquisa de preço de sambiquira.

“O pernil e o filé de frango aumentaram muito. Então, estou focando muito na sambiquira. Tem dia, quando chega 22h, vou vendendo mais sambiquira, para poder ajudar a segurar o preço. A minha clientela mesmo, de segunda a sexta, é da Vila. O poder aquisitivo dele é muito pouco. Não adianta eu querer vender meu espetinho a R$ 5, apesar de valer, e não vender. Tenho três filhos para criar, minhas contas para pagar. Meus três filhos não têm pais. Então, tenho que continuar com o preço de R$ 2 até para me manter”, disse.

Surpresa

O economista Feliciano Abreu, diretor do Mercado Mineiro, avalia que a estratégia de Sheila faz sentido, mas mostra-se surpreso por ela manter o preço por tantos anos.

“A gente fica até surpreso e admirado de ela, como empreendedora, está mantendo o negócio, porque realmente é difícil. Mas a gente entende também que se ela aumentar o preço, muitas vezes, vai perder a maioria dos seus clientes, que, normalmente, não conseguem acompanhar a inflação que já existe há muito tempo e acelerou depois da pandemia”, destacou.

Jornalista formado pela Newton Paiva. É repórter da rádio Itatiaia desde 2013, com atuação em todas editorias. Atualmente, está na editoria de cidades.