Quase metade dos ambientes aquáticos do planeta está gravemente contaminada por lixo. É o que mostra um levantamento de pesquisadores da Universidade Federal de São Paulo (Unifesp), que analisou 6.049 registros de poluição em rios, praias, estuários e manguezais de todos os continentes nos últimos dez anos. Segundo o pesquisador Ítalo Braga de Castro, coordenador do estudo, 46% dos locais avaliados foram classificados como “sujos” ou “extremamente sujos” com base no Clean-Coast Index (CCI), uma métrica internacional que mede a densidade de resíduos sólidos.
O trabalho foi publicado no Journal of Hazardous Materials. O Brasil aparece com o maior número de áreas monitoradas no período. Mas isso não significa que a situação seja positiva.
“Os resultados mostram que cerca de 30% dos ambientes costeiros brasileiros foram considerados sujos ou extremamente sujos”, afirmou Castro. Um dos pontos mais críticos identificados no mundo fica no país: os manguezais de Santos, na Baixada Santista.
Segundo o doutorando Victor Vasques Ribeiro, líder da pesquisa, a composição do lixo encontrado é praticamente a mesma em diferentes regiões do planeta. “Há uma homogeneidade impressionante. Plásticos e bitucas de cigarro representam quase 80% dos resíduos”, disse.
Os plásticos, que correspondem a 68% dos itens, persistem por longos períodos no meio ambiente e se fragmentam em micro e nanoplásticos, espalhados por correntes oceânicas. Já as bitucas de cigarros, que representam 11%, liberam mais de 150 substâncias tóxicas. O estudo também avaliou como áreas de proteção ambiental influenciam o nível de contaminação. A conclusão é que elas fazem diferença.
“A proteção reduz a presença de lixo em até sete vezes”, explicou o pesquisador Danilo Freitas Rangel. Ainda assim, nem mesmo essas áreas estão livres do problema: 31% delas foram classificadas como sujas. Os pesquisadores também identificaram o chamado “efeito de borda”: o lixo tende a se acumular principalmente nos limites das áreas protegidas.
“As bordas são mais vulneráveis por causa da pressão humana, do turismo, da urbanização e do transporte de resíduos por rios e correntes marinhas”, completou Castro.
O grupo ainda cruzou dados ambientais com índices socioeconômicos globais. De acordo com o pesquisador Leonardo Lopes Costa, o comportamento é desigual. “Fora das áreas protegidas, a contaminação aumenta nos primeiros estágios de desenvolvimento econômico e só cai quando o país melhora a infraestrutura e a governança ambiental. Dentro das áreas protegidas, ocorre o contrário: quanto maior o desenvolvimento, maior a contaminação”, explicou.
A pesquisa reforça que o combate ao lixo, principalmente o plástico, depende de ações coordenadas entre governos, indústria e sociedade. “Sem mudanças estruturais na governança global do lixo, a crise tende a se agravar. Os resultados oferecem uma base científica inédita para políticas públicas e tratados internacionais”, conclui Castro.