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Jeferson Tenório, autor de ‘O Avesso da Pele’, livro suspenso de escolas, vem a BH no Sempre um Papo

Obra vencedora do Jabuti foi retirada de escolas por Paraná e Goiás por pressão de políticos; vendas na Amazon cresceram 400%

Após Paraná, Goiás também retira livro “O Avesso da Pele“ das escolas estaduais | CNN Brasil

O escritor Jeferson Tenório, autor de “O Avesso da Pele”, abre a temporada 2024 do Sempre um Papo, em Belo Horizonte, na próxima quinta-feira (14). O encontro, que terá o tema “O avesso da censura: o papel da literatura em ambientes conservadores”, ocorre na Biblioteca Pública Estadual de Minas Gerais, na Praça da Liberdade, a partir de 19h30.

A obra, vencedora do Prêmio Jabuti em 2021, voltou ao noticiário desde que as secretarias de Educação do Paraná e de Goiás decidiram suspender a distribuição em escolas de ensino médio. Nesta quinta-feira (7), a Amazon informou à Itatiaia que as vendas de “O Avesso da Pele” cresceram 400% desde 1º março, quando começou a pressão para a suspensão do livro. Tenório e a Companhia das Letras, editora responsável pela publicação, consideram que a obra é alvo de censura.

O que é ‘O Avesso da Pele’

O “Avesso da Pele”, de Jeferson Tenório, narra a história de Pedro, um professor de literatura que decide pesquisar a história da família após o pai ser assassinado em uma abordagem policial em Porto Alegre. É uma história sobre racismo, com descrições cruas sobre violência e preconceito. “O Avesso da Pele” é uma das obras cobradas no vestibular do ITA (Instituto Tecnológico de Aeronáutica) em 2024, um dos mais concorridos do país.

Na semana passada, a diretora de uma escola no Rio Grande do Sul reclamou da adoção do livro de Tenório em escolas públicas por considerar que a obra utiliza ‘vocabulários de tão baixo nível para serem trabalhados com estudantes do ensino médio’, ou seja, de 15 a 17 anos. Políticos conservadores entraram na onda para pressionar estados a suspender a obra, que foi aprovada em 2022 para serem utilizadas em 2023 pelo Programa Nacional do Livro Didático (PNLD), do Ministério da Educação (MEC).

Ministra repudia ataques à obra O Avesso da Pele, alvo de censura em escola pública

Segundo o ministério, “os livros aprovados passam a compor um catálogo no qual as escolas podem escolher, de forma democrática, os materiais que mais se adequam à sua realidade pedagógica, tendo como diretriz o respeito ao pluralismo de concepções pedagógicas”. A secretaria de Educação de Goiás informou que o livro passará por análise “quanto ao atendimento da proposta pedagógica da rede pública estadual de ensino” e, assim, decidir se o material “poderá ou não ser distribuído”. O Paraná afirmou que o livro passará por “análise pedagógica e posterior encaminhamentos” e marcou data para que as escolas entreguem os exemplares.

‘Tentativa de censura’

Jeferson Tenório desabafou sobre a situação. “Não vamos aceitar qualquer tipo de censura ou movimentos autoritários que prejudiquem estudantes de ler e refletir sobre a sociedade em que vivemos”. O autor destaca que a diretora de escola que iniciou a pressão pelo boicote ao livro questiona a descrição de atos sexuais, mas não se incomodou com a violência e o racismo. “As distorções e fake news são estratégias de uma extrema direita que promove a desinformação. O mais curioso é que as palavras de “baixo calão” e os atos sexuais do livro causam mais incômodo do que o racismo, a violência policial e a morte de pessoas negras”, postou Tenório no Instagram.

Em nota, a Companhia das Letras alegou que a decisão ‘causa espanto’ e foi baseada em vídeo ‘que distorce e tira de contexto trechos isolados do livro’. ‘A Secretaria de Educação não apenas limita o acesso à informação, mas também mina a autonomia dos educadores e das escolas prevista no PNLD e na legislação educacional. Ela também cerceia a liberdade de pensamento, o direito à educação e à literatura dos jovens. Repudiamos qualquer tentativa de impor uma visão única e limitada sobre a realidade, seja por meio da censura de livros, pela restrição de temáticas no ambiente escolar ou de qualquer outra forma de obstáculo à liberdade de expressão’, aponta.

A editora destaca que as obras distribuídas na rede de ensino são acompanhadas por material de apoio pedagógico que discute temáticas abordadas, assim como questões textuais, de expressão e narrativa.

A Companhia das Letras classifica “O Avesso da Pele” como um romance sobre complexas relações sociais, violência e negritude. ‘Com uma narrativa sensível e também contundente, Tenório traz à superfície um país marcado pelo racismo e por um sistema educacional falido, e um denso relato sobre as relações entre pais e filhos’.

Enzo Menezes é chefe de reportagem do portal da Itatiaia desde 2022. Mestrando em Comunicação Social na UFMG, fez pós-graduação na Escola do Legislativo da ALMG e jornalismo na Fumec. Foi produtor e coordenador de produção da Record e repórter do R7 e de O Tempo