Ouvindo...

Cannabis medicinal: entenda a substância usada por Eduardo Suplicy para tratar o Parkinson

Acesso à substância é restrito e precisa de indicação médica

Eduardo Suplicy

O deputado estadual Eduardo Suplicy (PT-SP) revelou, nesta terça-feira (19), que foi diagnosticado com a doença de Parkinson e que está se tratando com cannabis medicinal. A substância natural, extraída da planta conhecida como maconha (cannabis sativa), é capaz de diminuir crises, tremores e dores em pacientes de inúmeras doenças, como ansiedade, depressão, epilepsia, autismo, Alzheimer, Mal de Parkinson, esclerose múltipla e fibromialgia.

O psicólogo da Associação Brasileira de Pacientes de Cannabis Medicinal (AMA+ME) e conselheiro do Conselho Regional de Psicologia de Minas Gerais (CRP-MG), Anderson Matos, explica que o uso da cannabis afeta um sistema do corpo chamado endocanabinoide, responsável pela regulação e equilíbrio de uma série de processos fisiológicos do corpo humano.

“Esse sistema controla todos os outros sistemas do corpo. Por isso, a cannabis recobre um número gigantesco de doenças. No caso do Mal de Parkinson, ela melhora os tremores, o equilíbrio, e, até mesmo, o humor do paciente”, esclarece o psicólogo.

Em entrevista à Folha de São Paulo, Suplicy contou ter sentido tremores nas mãos, principalmente na hora de comer e segurar os talheres, dores musculares em uma das pernas, e desequilíbrios. Mas, a partir do uso da cannabis medicinal, o deputado relatou que os sintomas diminuíram. “A dor na perna sumiu. O tremor, na hora de comer, melhorou. Tenho caminhado com firmeza”, relatou.

Matos avalia que a cannabis pode ser mais eficaz na melhoria dos sintomas do que os medicamentos convencionais. “Como a cannabis equilibra um sistema que a gente já tem [o endocanabinoide], ela é mais eficaz do que os medicamentos comuns. Além disso, muitas vezes os remédios convencionais têm efeitos colaterais, o que quase não acontece com a cannabis”, diz o psicólogo.

Canabidiol (CDB) x Tetrahidrocanabinol (THC)

A cannabis tem duas substâncias que atuam no Sistema Nervoso Central, o Canabidiol (CDB) e o Tetrahidrocanabinol (THC). Anderson Matos explica que as duas possuem benefícios reconhecidos, mas apenas o Canabidiol é visto como terapêutico. “O CBD ficou com a fama de bonzinho na sociedade. Já o THC, com a fama de mau, por causa das suas reações psicoativas. Porém, esses efeitos são bem menos graves do que se difundiu no senso comum. A maconha não causa esquizofrenia, nem psicose, como muitas pessoas ainda acreditam”, afirma.

O psicólogo defende que as possíveis alterações psíquicas causadas pelo uso do THC não justificam a proibição do uso da cannabis medicinal. “O fato de o paciente ter algumas alterações não justifica o cerceamento do direito ao tratamento. Essas reações são pequenas perto do benefício que ele vai ter com o uso da substância”, pontua.

A cannabis medicinal é permitida no Brasil?

Inicialmente, os pacientes que tinham indicação médica de uso da cannabis precisavam de uma decisão judicial para importar a substância. Hoje o acesso está mais simples.

Os pacientes podem solicitar a importação do medicamento junto à Anvisa, nos postos do órgão (nos aeroportos e áreas de fronteiras). Para isso, basta apresentar a receita médica, indicando a quantidade a ser importada. Caso a solicitação seja aceita pela Anvisa, uma autorização, válida por dois anos, será emitida para a importação dos produtos derivados da Cannabis.

Além da substância importada, algumas associações de pacientes de cannabis medicinal brasileiras têm autorização para plantar a maconha e produzir os medicamentos em território nacional. “Hoje, o Brasil conta com mais de 50 associações de pacientes. Elas têm condição de atender todos as pessoas que precisam da cannabis medicinal no país. Não faz mais sentido importar, a não ser que seja uma composição muito específica”, explica o psicólogo da AMA+ME.

Para ter acesso ao medicamento nacional é obrigatório integrar uma associação. As regras para se juntar a uma delas são residir no Brasil, ser maior de 18 anos ou menor representado(a) pelo(a) responsável legal, e portador de doença passível de tratamento complementar com cannabis medicinal.

O medicamento ainda não é oferecido no Sistema Único de Saúde em âmbito federal. Mas, alguns estados e municípios têm legislações que garantem o acesso à cannabis gratuitamente.

Uso da substância é tabu

A importação da substância foi autorizada pela Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) em 2015.

No Brasil, o plantio da maconha para o uso medicinal ainda não é permitido. A lei estabelece que, mesmo em pequenas quantidades, o plantio configura crime de tráfico de drogas. Ativistas do uso da substância no tratamento de doenças lutam para que o Governo Federal permita o plantio doméstico para quem precisa.

“A regulamentação do plantio e uso da cannabis é extremamente importante. Inclusive, lutamos para que seja permitido o plantio da maconha doméstico por pacientes que necessitam da substância para tratamento. Isso melhoraria o acesso dessas pessoas à medicação e a qualidade de vida desses pacientes”, defende Matos.

A discussão está sendo feita no Congresso Nacional.

Fernanda Rodrigues é repórter da Itatiaia. Graduada em Jornalismo e Relações Internacionais, cobre principalmente Brasil e Mundo.