Ouvindo...

Mulheres geram renda e transformam vidas na bacia do Rio Doce

Projeto de aquaponia liderado por mulheres revitaliza a economia na bacia do Rio Doce

Cultivo de hortaliças

Em Povoação, distrito de Linhares, no Espírito Santo, um grupo de 15 mulheres está transformando a pesca tradicional com um projeto sustentável: o cultivo de tilápias em sistema de aquaponia. Integrando a criação de peixes em tanques suspensos ao cultivo de hortaliças, a iniciativa não só gera renda e oportunidades para a comunidade, como também empodera as mulheres.

A base da iniciativa é a aquaponia, sistema que integra a criação de tilápias em tanques suspensos e o cultivo de hortaliças de forma produtiva e sustentável. No comando do negócio está um grupo de 15 moradoras que se dedicam a produzir, buscar mercados e gerar oportunidades de crescimento para a atividade.

“A mulher, na pesca, sempre teve um papel secundário, dependente do marido. No cultivo da tilápia temos liberdade de ser quem somos: protagonistas da nossa história. Aqui é a gente que decide, a gente que produz. Ganhamos uma forma nova de trabalhar e estamos vivendo essa nova fase”, afirma Andrea Aparecida Ferreira Anchieta, liderança entre as produtoras de Povoação.

Descendente de quilombolas e filha de pescadores, Andrea é uma agente importante dessa história. Ela participou da concepção, defendeu a proposta, buscou apoio e conseguiu tirar o projeto do papel. Também está à frente na tarefa de garantir sustentabilidade para o negócio. “Esse é o nosso desafio agora. Estamos no momento de reduzir gastos para gerar rendimento, porque ainda não conseguimos manter um faturamento regular para as produtoras”, afirma.

Atualmente, o pescado produzido nos nove tanques instalados no projeto é vendido in natura para restaurantes e famílias de Povoação. A produção é pequena, mas a meta é ampliar. Nesse sentido, o próximo passo será a construção de uma peixaria para beneficiar o pescado e um restaurante que será aberto ao público e ajudará a divulgar os produtos.

Em um espaço anexo recém-construído para dar suporte ao projeto, que funciona no mesmo terreno onde está localizada a Associação de Pesca de Povoação, Andrea conta que também será aberta uma loja. O foco será a venda de camisetas, bonés e lembranças em geral, já pensando no plano de incrementar o turismo de experiência na Vila de Povoação.

Eventos tradicionais dão visibilidade ao projeto

Festas e eventos tradicionais de Povoação são parte da estratégia de gerar renda e dar visibilidade ao projeto “Tilápia – Mulheres da Pesca”. O Festival da Tilápia (uma adaptação do antigo Festival da Manjuba) teve sua primeira edição em 2023 e estreou com êxito: atraiu mais de 3 mil pessoas. Em 2024, o sucesso se repetiu. No Festival, restaurantes e barracas ofereceram uma variedade de pratos à base de tilápia. Além de saborear a gastronomia, o público pôde comprar o peixe fresco, diretamente dos tanques do projeto.

Outro evento típico da região, a Festa do Robalo é um concurso gastronômico que tem como objetivo incentivar pequenos comerciantes e empreendedores locais. A edição mais recente foi realizada em novembro de 2024.

Pescando Oportunidades

A ideia de implantar um projeto de cultivo de tilápias em tanques nasceu na comunidade de Povoação, após o rompimento da barragem de Fundão, em Mariana, MG. A Associação de Pesca local recebeu recursos advindos das ações de reparação para a capacitação e construção de tanques de tilápia interligados a tanques de aquaponia por um sistema de filtragem e decantação. A iniciativa foi referência para o projeto de cultivo de organismos aquáticos Pescando Oportunidades, que se expandiu para outras comunidades: Areal, Entre Rios e Regência.

O Pescando Oportunidades é desenvolvido em parceria com o Instituto Brasileiro de Desenvolvimento e Sustentabilidade (IABS), responsável pela capacitação e a assistência técnica oferecida aos participantes.

“Prestamos um serviço para que os produtores possam alcançar o máximo de produtividade, tanto em relação ao cultivo de peixes quanto à produção de hortaliças. Estamos fazendo também um teste com o cultivo de camarão de água doce no sistema. O que a gente faz é mostrar para os beneficiários como seria uma condução do sistema aquapônico, para que eles consigam produzir o máximo possível, com custo baixo, e depois vender o produto no mercado e ter lucro”, explica Lucas Mendes, engenheiro de aquicultura do IABS.

A aquaponia é uma alternativa de negócio sustentável, capaz de gerar renda e ao mesmo tempo contribuir para a preservação dos recursos naturais. Os peixes, criados em tanques e alimentados por ração, liberam nutrientes que são bombeados para outros tanques, onde estão as hortaliças. As plantas se alimentam desses nutrientes e ainda purificam a água, que retorna para o local onde são produzidos os peixes, retroalimentando o sistema.

A iniciativa integra o programa Retomada das Atividades Aquícolas e Pesqueiras, que visa apoiar pescadores, aquicultores e areeiros impactados pelo rompimento da barragem de Fundão. Através de ações coletivas, o programa buscou recompor áreas produtivas, qualificar a mão de obra e gerar renda. Até o momento, os gastos acumulados com ações de reparação, somente nesse programa, já somam R$72,5 milhões.

Leia também

*Giulia Di Napoli colabora com reportagens para o portal da Itatiaia. Jornalista graduada pela UFMG (Universidade Federal de Minas Gerais), participou de reportagem premiada pela CDL/BH em 2022.