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Relembre duetos do eterno Erasmo Carlos com Gal, Bethânia e Caetano

Cantor e compositor foi um dos mais celebrados pela nata da MPB, dando novas versões a sucessos como ‘Cavalgada’ e ‘Olha’

Erasmo Carlos gravou versões de seus sucessos com Maria Bethânia, Gal Costa e Caetano Veloso

Um tremendo sujeito com fama de mau, chamado de Gigante Gentil pelos amigos. Assim era Erasmo Carlos, ícone da Jovem Guarda que morreu em 2022, aos 81 anos, deixando um legado de muita saudade e canções inesquecíveis. Ao lado do amigo de fé e irmão camarada Roberto Carlos, o sempre inquieto Erasmo criou um dos repertórios mais populares da história da música brasileira, que passou da rebeldia juvenil ao romantismo em forma de balada. Já consagrado, ele revisitou esse repertório com a nata da MPB, acompanhado por Caetano Veloso, Gal, Bethânia, Chico Buarque, entre outros.

“Minha Fama de Mau” (rock, 1964) – Erasmo Carlos e Roberto Carlos

O epíteto se pregou de tal forma a Erasmo Carlos que ele teve que passar a vida se explicando. Mas, como dizia a própria letra da música, ele tinha apenas “fama de mau”, quando era, na verdade, conhecido entre os amigos mais íntimos como Gigante Gentil. Seja como for, o lançamento de “Minha Fama de Mau”, parceria com Roberto Carlos, em 1964, num compacto da RGE, definiu, para sempre, a trajetória do Tremendão da música brasileira que, de uma forma ou de outra, assumiu a persona do rock-star rebelde e destemido. A música ainda intitulou uma biografia e um filme sobre a vida de Erasmo Carlos, e ganhou uma regravação ao lado de Rita Lee, outra roqueira com fama de má.

“Quero Que Vá Tudo Pro Inferno” (rock, 1965) – Roberto Carlos e Erasmo Carlos

Nara Leão foi a primeira artista a dedicar um álbum inteiro à obra de Roberto Carlos e Erasmo Carlos, quando artistas da MPB torciam o nariz para a dupla da Jovem Guarda. O que Nara não esperava é que depois ela teria problemas com isso. Batizado de “… E Que Tudo Mais Vá Pro Inferno”, verso retirado de “Quero Que Vá Tudo Pro Inferno”, rock de Roberto e Erasmo que se tornou o maior sucesso de 1965, o disco teve o título censurado pelo Rei, que passou a renegar a música por conta de sua conversão religiosa. Apesar disso, décadas mais tarde, Erasmo regravou esse hit, tendo como companhia Caetano Veloso.

“A Carta” (balada, 1966) – Raul Sampaio e Benil Santos

Seresteiro dos bons, Raul Sampaio nasceu em Cachoeiro do Itapemirim, no Espírito Santo, e compôs a famosa “Meu Cachoeiro”, regravada por Roberto Carlos, também natural da cidade litorânea, que ainda deu ao Brasil o talento do indomável Sérgio Sampaio. De volta a Raul Sampaio, o cantor lançou, em 1962, o samba-canção “Briguei Com Meu Amor”, de Rutinaldo e Airton Amorim. No entanto, sua composição mais conhecida provavelmente é “A Carta”, parceria com Benil Santos – com quem também criou sucessos de Miltinho –, lançada por Erasmo Carlos, e que a regravou em um dueto com Renato Russo.

“Se Você Pensa” (soul, 1968) – Erasmo Carlos e Roberto Carlos

Era nítida a implicância de Elis Regina com a Jovem Guarda, tanto que, em 1967, ela liderou a famigerada Passeata Contra a Guitarra Elétrica, que contou com as adesões de nomes de peso como Gilberto Gil, Edu Lobo, Geraldo Vandré e Jair Rodrigues. Dois anos depois, no entanto, ela já estaria convertida. Com produção de Nelson Motta, gravou “As Curvas da Estrada de Santos”, em 1970, no disco “Em Pleno Verão”. A aproximação começou em 1969, quando Elis registrou o soul “Se Você Pensa”, de 1968, e que ganhou uma divertida versão feita por Erasmo com As Frenéticas, em 1978. Sucesso...!

“Detalhes” (balada, 1971) – Roberto Carlos e Erasmo Carlos

Roberto Carlos e Erasmo Carlos recorrem a uma redundância para compor um dos versos mais famosos da música brasileira: “detalhes tão pequenos de nós dois”, dizem, em “Detalhes”, essa balada que colocou para sempre o nome de ambos no rol dos maiores sucessos do cancioneiro popular. Com a pegada romântica típica da dupla, essa balada lançada em 1971, no disco de Roberto Carlos, rapidamente se tornou uma febre, e não saiu nunca mais do repertório apresentado pelo Rei, em cruzeiros em alto mar e especiais de final de ano da Rede Globo. Em 1993, Maria Bethânia regravou esse clássico do romantismo. E, depois, Gal Costa e Erasmo gravaram outra versão arrebatadora da música.

“De Tanto Amor” (balada, 1971) – Roberto Carlos e Erasmo Carlos

Não é por acaso que o disco lançado por Roberto Carlos em 1971 é considerado um dos mais expressivos da carreira do Rei, afinal de contas, ali estavam canções como “Detalhes” e “De Tanto Amor”. Essa balada romântica fez tanto sucesso que mereceu regravações de Claudette Soares, Joanna, Roberta Miranda, Nando Reis, e tantos outros, sempre renovando a sua força junto às novas gerações, comprovando que o romantismo não tem idade. Quem também soube se apoderar desta canção foi um de seus autores, Erasmo Carlos, que a regravou com a companhia ilustre de Djavan. Puro luxo...

“O Comilão” (rock, 1973) – Roberto Carlos e Erasmo Carlos

Roberto Carlos, Erasmo Carlos, Jorge Benjor e Tim Maia foram todos criados na Tijuca, bairro da Zona Norte do Rio de Janeiro, conhecido por sua área tradicional e populosa. Foi ali que eles gestaram os primeiros acordes e começaram a se interessar por música, influenciados, principalmente, pelo rock norte-americano de Elvis Presley e Bill Halley. Cada um seguiu o seu caminho, mas, em 1980, Erasmo e Jorge Benjor voltaram a se encontrar para a regravação do descontraído rock “O Comilão”, lançado originalmente em 1973.

“Sou Uma Criança, Não Entendo Nada” (rock, 1974) – Erasmo Carlos e Giuseppe Artidoro Ghiaroni

Em 1974, Erasmo Carlos compôs com o poeta e jornalista Giuseppe Artidoro Ghiaroni mais um dentre os inúmeros sucessos da Jovem Guarda. “Sou Uma Criança, Não Entendo Nada”, lançada por Erasmo, e depois regravada com o grupo A Cor do Som. Na composição, Erasmo e Ghiaroni expõem toda a ânsia da criança em se tornar adulto, e, na sequência, a nostalgia desse mesmo adulto em relação à sua infância, quando “por dentro com a alma atarantada/ sou uma criança, não entendo nada”, reafirmam, nos versos finais da canção...

“O Portão” (balada, 1974) – Roberto Carlos e Erasmo Carlos

A imagem de um homem recebido por seu fiel cão, após um tempo longe de casa, foi escolhida por Roberto e Erasmo Carlos para demonstrar a força desse retorno, que se avoluma no refrão da música: “Eu voltei/ Agora pra ficar/ Porque aqui/ Aqui é o meu lugar”. Não é preciso dizer que a balada “O Portão” se tornou um clássico da música popular brasileira. Lançada em 1974, por Roberto Carlos, a música ganhou uma regravação poderosa de Erasmo com o grupo Kid Abelha, que contou com a voz doce e melodiosa de Paula Toller. Hit.

“Olha” (balada, 1975) – Roberto Carlos e Erasmo Carlos

Seguindo na trilha do romantismo, Roberto Carlos e Erasmo Carlos compuseram, em 1975, uma das peças mais sensíveis de seu repertório. Com um misterioso Roberto Carlos na capa, investindo na pinta de detetive com um cachimbo na boca, a balada “Olha” foi lançada pelo Rei em 1975. Mais tarde, recebeu gravações antológicas de Alcione, Gal Costa, Ivete Sangalo, Marília Barbosa e de Erasmo Carlos, em um dueto com Chico Buarque capaz de emocionar os corações mais calejados pelo tempo. Pois essa letra é atemporal.

“Meu Ego” (blues, 1977) – Erasmo Carlos e Roberto Carlos

No final de 1977, Nara Leão e Erasmo Carlos apresentaram, no programa “Fantástico”, da Rede Globo, a música “Meu Ego”, mais uma parceria do Tremendão com Roberto Carlos. A música havia sido lançada, naquele mesmo ano, no LP “Os Meus Amigos São Um Barato”, confirmando o pioneirismo de Nara, que dava a partida nos álbuns de duetos na música brasileira. No ano seguinte, em 1978, a música seria incluída no disco “Pelas Esquinas de Ipanema”, de Erasmo, renovando o sucesso desse blues cheio de ginga e luz...

“Cavalgada” (balada, 1977) – Roberto Carlos e Erasmo Carlos

“Cavalgada” é uma das músicas mais ousadas do repertório de Roberto e Erasmo Carlos, lançada pelo Rei em 1977, no disco de capa alaranjada, em que a luz do refletor imitava um sol. A partir de metáforas, Roberto e Erasmo descrevem uma relação sexual, sem perder o romantismo. Essa receita equilibrada gerou imagens poderosas, como “usar meus beijos como açoite” e “vou me deitar no seu cansaço”. A música ganhou regravação da dupla Bruno & Marrone, e gerou um dueto entre Erasmo e Maria Bethânia que é de arrepiar.

“Na Paz do Seu Sorriso” (balada, 1979) – Roberto Carlos e Erasmo Carlos

Roberto Carlos, Erasmo Carlos e Wanderléa formaram, muito provavelmente, um dos mais famosos trios da história da música brasileira, no comando do programa “Jovem Guarda”, na TV Record. A inspiração para o movimento juvenil vinha de uma frase do poeta russo Maiakovski: “O futuro pertence à Jovem Guarda”. Décadas depois, quando o movimento já tinha dado lugar à maturidade na carreira de cada um, Roberto Carlos lançou a balada “Na Paz do Seu Sorriso”, em 1979, regravada por Erasmo e Wanderléa. Eis uma pérola.

“Beira D’Água” (MPB, 1979) – Marku Ribas e Erasmo Carlos

Em 1979, Erasmo abriu parceria com Marku Ribas, mineiro de Pirapora. A música “Beira D’Água” renova o espírito de “Festa de Arromba”, um dos maiores sucessos de Erasmo Carlos e, não por acaso, traz o epíteto “A Festa”. Com influências da folia de reis, a canção enumera personagens célebres da canção popular brasileira, como Chico Buarque, Caetano Veloso, Roberto Carlos, Paulinho da Viola, Milton Nascimento, Jorge Benjor e Gilberto Gil, num clima descontraído, que deixa entrever a amizade entre Erasmo e Marku Ribas.

“Cama e Mesa” (balada, 1981) – Roberto Carlos e Erasmo Carlos

Roberto Carlos com um brasão de ouro dependurado no pescoço, e olhar desafiador. Cada capa lançada pelo Rei era um acontecimento, e os fãs esperavam ansiosamente pela próxima novidade. Em 1981, além da imagem, ficou marcada a música “Cama e Mesa”, principal destaque do álbum. Essa parceria de Erasmo e Roberto recebeu as mais variadas regravações, de nomes como Agepê, Martinho da Vila e Thiaguinho. Para não ficar de fora, Erasmo também a regravou, em um dueto inspirado feito com Zeca Pagodinho.

“Mesmo Que Seja Eu” (rock, 1982) – Erasmo Carlos e Roberto Carlos

Sabe o clichê “antes só do que mal acompanhado”? Pode ser uma boa resposta ao eu lírico da canção de Erasmo Carlos. “Mesmo Que Seja Eu” é o relato de um homem sobre a vida, segundo ele solitária, de uma mulher. Talvez a intenção de Erasmo tenha sido se declarar um homem apaixonado e protetor. A canção foi regravada por Marina Lima no LP “Fullgás”, onde ela habilmente reverteu o sentido original, e ganhou a regravação de Erasmo com Gilberto Gil. Em outra incursão renovadora, essa música recebeu a voz de Ney Matogrosso.

“O Tolo na Colina” (folk, 1984) – versão de Zé Ramalho

Lançada pelos Beatles em 1967, a canção cujo título é traduzido como “O Tolo na Colina” ganhou uma versão de Zé Ramalho, habituado a realizar esse tipo de procedimento com músicas de Bob Dylan. Com uma letra mística, religiosa e cheia de mistério, essa balada folk se afina ao estilo de Zé Ramalho, que a regravou em parceria com Erasmo Carlos, num bonito dueto. Antes, a música foi lançada, em 1984, pela cantora Amelinha, no disco “Água e Luz”. Esse encontro incomum entre artistas de estilos distintos é um achado da nossa MPB, e reafirma a diversidade como a principal qualidade da nossa sociedade.

“Do Fundo do Meu Coração” (balada, 1986) – Roberto e Erasmo Carlos

Roberto Carlos vinha, aos poucos, de descolando do título de ídolo da garotada para se consagrar como o Rei da música brasileira. Um dos principais ativos nesse movimento foi apostar em canções mais maduras, que deixavam para trás o espírito juvenil e rebelde, em busca de declarações de amor capazes de acalentar corações de todas as idades. “Como É Grande o Meu Amor Por Você” destoa do repertório de “Roberto Carlos em Ritmo de Aventura”, LP lançado em 1967, exatamente por esse motivo. Também de pegada romântica é a balada “Do Fundo do Meu Coração”, parceria com Erasmo lançada pelo Rei em 1986 e regravada em dueto com Adriana Calcanhotto em lindo registro.

“Papo de Esquina” (folk, 1988) – Roberto Carlos e Erasmo Carlos

Existem muitas duplas históricas na música popular brasileira, como Tom e Vinicius, João Bosco e Aldir Blanc, Vitor Martins e Ivan Lins, Luiz Gonzaga e Humberto Martins, Cazuza e Frejat, Rita Lee e Roberto de Carvalho, mas é difícil encontrar uma tabelinha que supere o sucesso de Roberto Carlos e Erasmo Carlos. Ícones do movimento conhecido como Jovem Guarda, eles estenderam o prestígio para além das fronteiras da febre juvenil e se consagraram como dois dos principais compositores do cancioneiro nacional. “Papo de Esquina”, folk de 1988, é uma música em forma de papo dessa dupla.

“Mais Um na Multidão” (balada, 2001) – Erasmo Carlos, Marisa Monte e Carlinhos Brown

Erasmo Carlos estreou em grande estilo a parceria com Marisa Monte e Carlinhos Brown, que formariam o trio Tribalistas com Arnaldo Antunes. Em 2001, Erasmo, ao lado de Marisa e Brown, compôs a bela balada “Mais Um na Multidão”, recuperando, em certa medida, o espírito das canções românticas que ele ajudou a consagrar na canção popular brasileira, ao lado de Roberto Carlos. Como se não bastasse, essa canção delicada, sensível, ainda conta com um dueto emocionante entre Erasmo e Marisa, que não poupam a sensualidade na voz e brindam o público com uma interpretação digna de tudo.