Não à toa chamam Mário Lago poeta. Além da função literária, ele desempenhava os serviços de ator, compositor, radialista e teatrólogo. Tudo com poesia. Sem mencionar que, por desvios dessa vida que a gente não imagina, formou-se em advocacia, embora procurasse, algumas vezes, esconder o diploma adquirido. Fonte de suas escritas eram as mulheres, Auroras e Amélias. E também o fracasso, condição existencial do homem. Por fim, nada além, Mário Lago somente poeta.
“Nada Além” (foxtrote, 1938) – Mário Lago e Custódio Mesquita
Custódio Mesquita e Mário Lago resumiram uma relação sublime na música brasileira. A alta costura dos versos do poeta associada ao esmero da melodia do compositor especificaram o amor em sua face menos dolorosa e possivelmente mais assumida, a doce ilusão. Docemente, Orlando Silva gravou o foxtrote “Nada Além”, em 1938, como era de sua categoria, acrescentando murmúrios chorosos ao final da canção. Nada mais bonito: “Nada além, nada além de uma ilusão, chega bem, que é demais para o meu coração, acreditando em tudo que o amor mentindo sempre diz, eu vou vivendo assim feliz, na ilusão de ser feliz”.
“Aurora” (marchinha, 1941) – Mário Lago e Roberto Roberti
Antes de Amélia, houve na vida de Mário Lago outra mulher. Sorte que ela não fosse sincera, pois lhe inspirou belas alfinetadas na sabida moça. Carmen Miranda alçou ao sucesso as qualidades de Aurora, que foi pela primeira vez cantada pela dupla formada por Joel e Gaúcho. No Carnaval de 1941, a marchinha de Roberto Roberti e Mário Lago alcançou glórias em terras brasileiras, inglesas e americanas, tornando-se inclusive, tema de filme estrangeiro. A música seguiu embalando multidões de foliões pelo Brasil afora.
“Ai, Que Saudades da Amélia” (samba, 1942) – Mário Lago e Ataulfo Alves
Mário Lago disse a vida inteira que Amélia não era uma mulher submissa, mas solidária, companheira, amiga nas horas difíceis. As feministas não o perdoaram por tais liberdades poéticas concedidas: “ás vezes passava fome ao meu lado, e achava bonito não ter o que comer”. A beleza do sofrimento retratada por Mário Lago, versos, e Ataulfo Alves, música, sobre a mulher idealizada, sinalizavam na realidade a dependência da atual esposa, segundo o próprio poeta: “Você não sabe o que é consciência, não vê que eu sou um pobre rapaz, você só pensa em luxo e riqueza, tudo que você vê você quer”.
Lançada no Carnaval de 1942, a canção dividiu a preferência do público com “Praça Onze”, de Herivelto Martins e Grande Otelo, e o prêmio teve mesmo destino. No entanto, “Amélia” penou para conquistar garantida sumidade na música brasileira. Foi recusada por todos os cantores as quais se ofereceu, até que o próprio Ataulfo Alves resolveu gravá-la, com a companhia de Jacob do Bandolim tocando a introdução. A trajetória da protagonista não foi das mais suaves, mas ao final, estava consagrada. E olha que Amélia existiu de verdade.
“Atire a Primeira Pedra” (samba, 1944) – Mário Lago e Ataulfo Alves
Foi ao Café Nice que Mário Lago se dirigiu para comemorar com Ataulfo Alves o estouro de “Atire a Primeira Pedra”, samba de amor custoso escrito pelos dois compositores. O famoso reduto da boemia carioca abrigava a música como que por espontânea ligação religiosa. E eram versos religiosos que valorizavam o sucesso da composição em ritmo de penitência. Com a interpretação de Orlando Silva em 1944, foi lançada por Emilinha Borba no filme “Tristezas não pagam dívidas”. A música desfilou na boca do povo com tamanha empolgação no carnaval daquele ano que de acordo com Mário Lago foi a única vez que viu o amigo Ataulfo de “pilequinho”.
“Fracasso” (samba-canção, 1946) – Mário Lago
Herdada a música de seus avós e de seu pai, Mário Lago foi instruído pela mãe a seguir a carreira de Vinicius de Moraes. Não que ele fosse poeta, compositor, artista, “profissões de fome”, segundo o pai que as vira de perto. Queriam que fosse diplomata e usasse casaca, perfeita para seu porte alto e magro. Mas Mário Lago contrariou a todos e tornou-se aquilo que não queriam. Com exímia sabedoria poetizou o tempo, galanteou as artes e foi músico do amor.
“Fracasso”, de 1946, é o samba-canção contrário à constância de sua trajetória, dedicada a aplausos por suas performances emocionais e honestas, ricas em despertar sinceros sentimentos. Os retumbantes versos finais da composição exclusiva de Mário Lago, “por te querer tanto bem e me fazer tanto mal”, emergiram das vozes graves de Francisco Alves e Nelson Gonçalves para perpetuar, mais uma vez, a essência de um homem que soube recolher da simplicidade o sumo de sua poesia.
“É Tão Gostoso, Seu Moço” (samba-canção, 1953) – Chocolate e Mário Lago
Compositor, ator e poeta, Mário Lago cunhou uma das mais precisas definições sobre a relação do ser humano com a passagem do tempo, aquele ser invisível e maciço que emolduramos em relógios, fotografias e calendários e nos encontra na pele e nos ossos. “Fiz um acordo com o tempo, nem ele me persegue, nem eu fujo dele. Um dia, a gente se encontra”, escreveu Lago. Em 1953, ele compôs com o comediante e melodista de fino-trato Chocolate, o samba-canção “É Tão Gostoso, Seu Moço”, belamente gravado por Nora Ney. A música obteve regravações das cantoras Áurea Martins, Tânia Maria, e etc...
“Eu Sei Que Você Não Presta” (samba-canção, 1953) – Mário Lago e Chocolate
Renata Fronzi nasceu em Rosário, na Argentina, no dia 1º de agosto de 1925, e morreu no dia 15 de abril de 2008, aos 82 anos. Filha de dois atores italianos radicados no Brasil, ela foi naturalizada brasileira e começou a carreira como bailarina no Teatro Municipal de São Paulo. Logo, passou a trabalhar na companhia de teatro de Eva Todor, atriz húngara também naturalizada brasileira. Renata Fronzi ficou conhecida como vedete no teatro de revista e estreou no cinema em 1946, na chanchada “Fantasma por Acaso”.
Renata Fronzi fez muito sucesso como a Helena da Família Trapo, ao lado de Jô Soares, Ronald Golias, Cidinha Campos, Otelo Zeloni e Ricardo Corte Real. Ela também gravou três compactos, e deu voz a músicas como “Portão Antigo”, de Antônio Maria, “Eu Sei Que Você Não Presta”, de Mário Lago e Chocolate, “Saara”, de Bororó, “Caso Perdido”, “Insulto”, “Prometi”, entre outras canções.