O piloto Daniel Ricciardo ficou afastado da Fórmula 1 por alguns meses neste ano, inicialmente porque perdeu a vaga na McLaren e, em seguida, por um acidente. De volta no Grande Prêmio dos Estados Unidos, o atleta teve uma fala polêmica ao tentar justificar a ausência de mulheres na Fórmula 1 durante participação em um programa estadunidense.
“Você acha que mulheres são boas motoristas?”, questiona o apresentador Caleb Pressley do “Sundae Conversation” ao piloto da AlphaTauri. Ricciardo diz que "é subjetivo”, mas concorda enquanto ri. "É ofensivo, não é? O estereótipo de que mulheres não são boas motoristas. É doloroso [para mulheres]”, continua o entrevistador, enquanto o australiano segue rindo.
“Se você observar as estatísticas, os fatos, na história da Fórmula 1... me diga o número de acidentes na pista causados por mulheres pilotas”, pede Pressley. A resposta de Ricciardo é: “tiveram poucas ou nenhuma mulher pilota na Fórmula 1". Questionado sobre o motivo da falta de mulheres no esporte, o piloto dá uma resposta evasiva, alegando que “só existem 20 [pilotos de F1] no mundo.”
Por que faltam mulheres na Fórmula 1?
A primeira resposta de Ricciardo é próxima da realidade. Desde o surgimento da Fórmula 1, em 1950, somente cinco mulheres participaram de um Grande Prêmio - entre quase 780 pilotos. Entre as cinco, duas delas sequer entraram na classificação e participaram de uma corrida. Desiré Wilson foi a única a vencer um GP, em 1980. Desde então, a última mulher na categoria foi Giovanna Amati, em 1992.
Atualmente, assim como em toda história da Fórmula 1, não existe nenhuma regra que impeça a entrada de mulheres na categoria - nem diferença física relevante entre homens e mulheres que justifique a ausência delas na categoria. Apesar disso, a entrada na F1 depende de visibilidade em categorias de base e, só para conseguir entrar nelas, são necessários investimentos altíssimos.
Buscando incentivar mulheres que pilotam, a Fórmula 1 anunciou, em 2022, a F1 Academy (academia da Fórmula 1, em português). A categoria só para mulheres foi iniciada neste ano e, considerando a questão do financiamento para as jovens, casa uma ganhou um subsídio de 150 mil euros para competir, cerca de 789 mil reais.
O primeiro campeonato foi encerrado no GP dos EUA, tendo a espanhola Marta Garcia, de 23 anos, como campeã. Quem também já participou da competição foi Bianca Bustamante, filipina de 18 anos que conquistou o posto de primeira mulher a participar da academia de pilotos da McLaren.
A etapa final da categoria foi realizada durante o GP dos Estados Unidos, em Austin. Dos 20 pilotos que atualmente compõem o grid de Fórmula 1, Lewis Hamilton foi o único piloto que, por livre e espontânea vontade, compareceu pessoalmente para manifestar apoio às pilotas. Nenhum dos pilotos da McLaren, agora equipe de Bia Bustamante, estiveram presentes.
Susie Wolff, diretora-gerente da F1 Academy, agradeceu o apoio do heptacampeão, mas demonstrou insatisfação com a ausência dos outros atletas. “Acho que, no final das contas, ele sabe o que é ser o único, então tem uma afinidade”, afirmou sobre Hamilton, que é o único piloto negro no grid. “Espero mais interação com as equipes na próxima temporada, porque eles têm a plataforma, eles têm a voz. Se quisermos ver sucesso, [o apoio] precisa ser a longo prazo.”
Indignação
A fala de Daniel Ricciardo sobre a ausência de mulheres na Fórmula 1 não foi bem interpretada por internautas, que consideraram o posicionamento do piloto como machista. “Daniel Ricciardo aparentemente adora ir a podcasts para fazer comentários sexistas”, relatou uma fã da categoria nas redes sociais. A publicação que acompanha o trecho do programa já foi vista mais de 2 milhões de vezes.
“Imagine o impacto positivo que ele poderia ter ao esclarecer que, na verdade, os homens têm uma probabilidade esmagadoramente maior de sofrer acidentes de carro do que as mulheres (na Austrália e em todo o mundo), que existem barreiras significativas que as mulheres enfrentam na F1 e isso não têm absolutamente nada a ver com habilidade”, completou outra internauta sobre o caso.