O médico Rômulo Soares, responsável técnico da UPA São Benedito, em Santa Luzia, na região metropolitana de Belo Horizonte, colocou o cargo à disposição após a blitz realizada pelo prefeito Paulo Bigodinho (Avante), no sábado passado, que culminou na demissão de um médico que se recusou a auxiliar no atendimento geral dos pacientes. Soares era o elo entre o Executivo municipal e os profissionais da unidade de saúde.
Em documento com data de 19 de janeiro - um dia após o episódio na UPA - e endereçado aos gestores municipais de Santa Luzia, o médico alega que “fatos ocorridos recentemente ferem os princípios éticos e agridem a integridade moral” da profissão.
“O fator desencadeador de tal decisão tem por base o princípio ético e moral que deve permear sempre toda e qualquer relação humana. Entendo também que alguns fatos ocorridos recentemente ferem os princípios éticos e agridem a integridade moral de uma profissão que tem por princípio, meio e fim a assistência à saúde da população. Como responsável técnico me sinto na obrigação legal que o cargo me exige de me posicionar acerca dos recentes acontecimentos que afetam diretamente na continuidade da assistência médica nas unidades em questão, entendo que o que será pontuado abaixo acarreta riscos e prejuízos para saúde da população de Santa Luzia e adjacências”, escreve o médico no documento.
Interlocutores disseram à Itatiaia que a saída de Rômulo Soares é a comprovação da falta de diálogo entre o Executivo municipal e a classe médica e demonstra a insatisfação do profissional com a organização do serviço de saúde em Santa Luzia.
Prefeitura tem versão diferente
Procurada pela Itatiaia, a prefeitura confirmou o desligamento, mas tem uma versão diferente da apresentada pelo médico. O Executivo municipal alega que já havia solicitado o desligamento de Rômulo Soares dos quadros da Medplus, empresa terceirizada responsável pelos profissionais das unidades de saúde de Santa Luzia. A notificação com o pedido de demissão foi enviada, conforme a prefeitura, na sexta-feira passada (17), um dia antes do episódio na UPA São Benedito.
“A Prefeitura de Santa Luzia, por meio da Secretaria Municipal de Saúde, informa que, no dia 17 de janeiro de 2025, foi enviada uma notificação oficial à empresa MedPlus Serviços Médicos, responsável pelo contrato n° 293/2019. A notificação tratou da necessidade imediata e irrevogável do desligamento do Sr. Rômulo Soares Teixeira, de qualquer atividade profissional em estabelecimentos públicos de saúde do município”, diz trecho do documento enviado à reportagem.
No mesmo documento, a prefeitura pedia que outro profissional, o médico Jonathan Cristiano Tibério, assumisse as funções de coordenador clínico, coordenador cirurgião e responsável técnico da UPA São Benedito, além de responsável técnico do Hospital Municipal Madalena Parrillo Calixto.
Relembre o caso
No sábado passado (18), Paulo Bigodinho demitiu um médico que se recusou a reforçar o atendimento geral da UPA São Benedito. O profissional, cuja identidade não foi divulgada, estava na sala de descanso quando foi abordado pelo prefeito, que o questionou sobre a possibilidade de ajudar nas consultas.
O médico, por sua vez, disse que sua função era voltada exclusivamente para atendimento de urgência. Incomodado com a negativa, Bigodinho, então, o informou da demissão. “Então não tem jeito? Você pode ajudar hoje? Não pode? Então é seu último dia aqui”, disse o prefeito na oportunidade.
A MedPlus Serviços Médicos, responsável pelo profissional, afirmou que não era obrigação do médico realizar o atendimento geral na UPA. “A MedPlus informa que o médico em questão foi contratado para trabalhar em atendimentos de casos de urgência e emergência na UPA São Benedito, de Santa Luzia (MG)”, disse a empresa.
Procurado pela Itatiaia, o diretor do Sindicato dos Médicos de Minas Gerais (Sinmed-MG), Arthur Oliveira Mendes, criticou a decisão e disse que profissionais da área de emergência não podem deixar o local de trabalho para realizar atendimentos gerais.
O que diz Conselho Regional de Medicina?
Questionado pela reportagem, o Conselho Regional de Medicina de Minas Gerais (CRMMG) corroborou a informação do Sinmed e disse que um médico não pode realizar plantões em duas áreas diferentes. “O CRMMG esclarece, de forma geral, que o Código de Ética Médica veda ao profissional a realização de plantões em duas áreas distintas, ainda que na mesma unidade de saúde. Essa orientação visa garantir a qualidade e a segurança do atendimento aos pacientes. Ressaltamos ainda que condições de trabalho inadequadas podem comprometer o exercício da medicina e violar o direito dos pacientes a um atendimento digno e de qualidade”, diz trecho da nota enviada.