Na noite da última quinta-feira (22),
Marcelo Mariano, ex-diretor administrativo, Sérgio Moura, ex-superintendente de marketing, e Alex Fernando André, apontado como intermediário, foram indiciados pelos mesmos crimes. Já a situação de Yun Ki Lee, ex-diretor jurídico, ainda será avaliada. O advogado pediu habilitação nos autos, e o pedido ainda está sendo apreciado pela Polícia.
Um relatório da Polícia Civil de São Paulo, produzido pela 3ª Delegacia do Departamento de Polícia de Proteção à Cidadania (DPPC), revelou detalhes de uma investigação complexa sobre o contrato milionário de patrocínio entre o Corinthians e a empresa de apostas VaideBet. A apuração expõe uma teia de contradições, suspeitas de fraude, falsificação de documentos, transferências milionárias suspeitas e tentativas de ocultação de responsabilidades.
A Rádio Itatiaia teve acesso ao relatório e destrincha, a seguir, tópico por tópico.
Negociação sob suspeita e ausência de intermediário oficial
O ponto central da investigação é a figura de Alex Fernando André, conhecido como Alex Cassundé, inicialmente apontado como intermediário do contrato. Contudo, o relatório afirma categoricamente que Alex não participou efetivamente da intermediação do patrocínio.
Conforme as conclusões da Polícia, o verdadeiro contato entre o Corinthians e a VaideBet foi promovido por outras pessoas, como Antônio Pereira dos Santos (conhecido como Toninho), Sandro dos Santos Ribeiro e Washington de Araújo Silva. Alex admitiu em depoimento que sua atuação se resumiu a uma indicação e que não exigiu nenhuma comissão pela suposta intermediação.
Toninho e Sandro, juntamente com Washington, um dos responsáveis pelo gerenciamento das redes sociais do Corinthians, teriam iniciado o contato via Instagram e seguido todo o processo que culminou na reunião realizada no Hotel Tivoli, em 27 de dezembro de 2023, com a presença, além deles, de Augusto Melo e Marcelo Mariano. Foi nessa reunião que o patrocínio da VaideBet com o Corinthians foi acordado, pelo menos de forma preliminar.
Sandro relatou que conheceu Washington pelo Instagram e que este o convidou para um café em Mogi das Cruzes para discutir possibilidades futuras, caso a chapa corintiana apoiada ganhasse a eleição. Posteriormente, houve reuniões presenciais para acertar detalhes do patrocínio, com a participação confirmada de Marcelo Mariano.
Diferentemente dos investigados, que não possuem provas, mensagens ou fotos que comprovem a participação direta na intermediação, Toninho, Washington e Sandro possuem evidências robustas, incluindo fotos juntos e registros de conversas que confirmam suas atuações na aproximação da VaideBet com o Corinthians.
Após o fechamento do contrato, Sandro publicou em suas redes sociais agradecimentos à parceria, marcando a VaideBet, o Washington, o Corinthians e o dirigente Augusto Melo, reforçando ainda mais sua participação direta.
Mesmo com tentativas por parte de Marcelo Mariano e Augusto Melo de negar a participação do trio, as evidências apresentadas dão credibilidade à versão de que foram eles os verdadeiros intermediários do acordo. Até o momento, não há comprovação da participação efetiva de Alex Fernando André nas negociações.
Por fim, o próprio Augusto Melo gravou um vídeo no Hotel Tivoli com Sandro no dia da reunião e, em depoimento posterior, disse não conhecer Sandro, sugerindo que quem esteve presente poderia ter sido Toninho. Marcelo Mariano também foi visto logo atrás neste registro.
Conflito entre versões dos investigados e dados das ERBs
Um dos pontos mais contundentes da investigação é o conflito entre os depoimentos dos envolvidos e os dados técnicos obtidos pelas Estações Rádio Base (ERBs) dos celulares.
Os investigados Alex Fernando André, Marcelo Mariano e Sérgio Moura apresentaram versões conflitantes sobre quem participou das reuniões no mês de dezembro de 2023, quem marcou os encontros e quem intermediou o contrato.
Alex afirmou que esteve presente no Parque São Jorge, sede do Corinthians, por volta do dia 20 ou 21 de dezembro de 2023, para reuniões e tratativas, sem a companhia de Sérgio, que teria tirado dias de folga. Já Marcelo, por sua vez, mencionou que Sérgio levou Alex ao clube para apresentá-lo.
Sérgio tentou seguir a mesma linha de Marcelo, afirmando que teria levado Alex Cassundé à sede social do Timão, onde o teria apresentado ao ex-diretor administrativo do clube.
Em nenhum dos três depoimentos, a presença de Augusto Melo foi mencionada no referido encontro no Parque São Jorge.
No entanto, o próprio presidente, em seu depoimento, declarou estar presente no encontro ocorrido, situação em que teria sido apresentado a Alex Cassundé.
Entretanto, os registros das ERBs revelaram que Alex Cassundé não esteve no Parque São Jorge entre 9 e 31 de dezembro de 2023, período em que as negociações aconteceram.
Além disso, o telefone de Alex Cassundé foi formatado no dia 31 de maio de 2024, data próxima ao início das investigações, sugerindo tentativa de apagamento de provas digitais.
Esse confronto entre versões e dados técnicos foi decisivo para a polícia concluir que Alex não foi o intermediário das negociações e que sua inclusão no contrato pode ter sido uma tentativa de mascarar os verdadeiros responsáveis.
Transferências milionárias e suspeita de golpe envolvendo a Neoway
Documentos sigilosos bancários revelaram que, nos dias 25 e 26 de março de 2024, a empresa Rede Social Media Design, da qual Alex Cassundé é sócio-proprietário, realizou duas transferências para a Neoway Soluções Integradas, totalizando R$ 1.042.000,00.
Curiosamente, os dados de localização indicam que Alex Cassundé esteve no Parque São Jorge justamente no dia 25 de março de 2024, quando uma das transferências foi feita. A Polícia levantou a hipótese de que Alex recebeu ali os dados bancários da Neoway, empresa suspeita de ser uma “fantasma” no esquema.
No depoimento, Cassundé afirmou que os dados da Neoway foram passados a ele por um homem denominado Maurício Manfra, com quem teria fechado um negócio estimado em R$ 1.060.000,00. Segundo Alex, Manfra prometeu entregar um sistema de telemedicina para pets em 30 dias, mas não cumpriu o combinado e desapareceu.
Contudo, a investigação encontrou indícios de que Maurício Manfra estava incapacitado e acamado por doença degenerativa desde o início de 2024, vindo a falecer em 26 de abril daquele ano. Sua linha telefônica foi desativada em 31 de maio, no início das investigações, e não há registros de contato efetivo com Alex naquele período.
Alex admitiu ter sofrido um golpe e ter perdido o montante superior a um milhão de reais, mas não registrou boletim de ocorrência ou tomou qualquer medida para recuperar o valor. Ele também declarou que possuía assessoria empresarial há quatro anos, mas que essas tratativas não foram comunicadas a seus advogados ou assessores, levantando dúvidas sobre a versão apresentada.
Comissão milionária e falsificação de assinatura
O contrato de patrocínio entre o Corinthians e a VaideBet envolveu uma comissão de intermediação superior a R$ 25 milhões, mas não há clareza sobre quem recebeu esse montante. Alex Cassundé negou categoricamente ter recebido qualquer pagamento direto, sugerindo que valores estariam vinculados a contratos paralelos de marketing.
Além disso, a polícia mencionou uma matéria veiculada pelo Blog do Paulinho que denunciou a possível falsificação da assinatura de Alex no contrato. A polícia confirmou essa suspeita após análise comparativa das assinaturas, indicando que a assinatura no documento foi forjada para dar aparência legal ao acordo.
Conclusão da polícia
Tiago Fernando Correia, delegado responsável pelo caso, concluiu que:
- Alex Fernando André não foi intermediário legítimo do contrato;
- Sua inclusão no acordo serviu para mascarar os verdadeiros responsáveis pela negociação;
- Todos os investigados apresentaram versões contraditórias e omitiram informações importantes;
- Há indícios de tentativa de ocultação de provas e falsificação de documentos para legitimar o patrocínio;
- Há indícios ainda de transações financeiras suspeitas ligadas a empresas possivelmente fantasmas, em operações feitas em datas coincidentes com a presença de investigados nos locais das negociações.
O indiciamento será feito na modalidade indireta, pois os investigados já foram ouvidos e tiveram assegurado seu direito de defesa.
Por fim, o delegado deixou de avaliar, por ora, a possível responsabilidade penal de Yun Ki Lee, que tratava diretamente com Augusto, Marcelo e Sérgio algumas questões e não teria se atentado a detalhes cruciais da negociação, apesar de sua experiência profissional.
Próximos passos
A Polícia Civil vai encaminhar todo o material ao Ministério Público na próxima semana. O MP é o órgão responsável por analisar o caso e decidir se oferece a denúncia ou não.
Se o MP entender que há provas suficientes para acusar formalmente os indiciados, apresentará formalmente uma denúncia ao Judiciário.
Se o juiz aceitar a denúncia, dará início ao processo criminal, com fases de instrução, produção de provas audiências e julgamento.