Nitretação iônica: como aumentar a vida útil de peças sem elevar o custo de produção

Especialistas do Senai explicam como a tecnologia equilibra dureza e flexibilidade em peças metálicas submetidas a desgaste e impactos simultâneos

A nitretação modifica a superfície dos materiais

É preciso resolver um dilema que persegue engenheiros há décadas: os materiais duríssimos, como cerâmicos, suportam o desgaste de maneira exemplar, mas se sofrem um impacto, quebram. Do outro lado, os materiais maleáveis absorvem os golpes sem se danificar, porém se desgastam facilmente sob atrito contínuo.

“Se utilizamos um material muito duro, temos alta dureza e resistência ao desgaste, mas se este material sofre impacto... Se quebra. Por outro lado, se coloco um material macio, ele não vai se quebrar com o impacto, mas vai se desgastar facilmente”, exemplifica Mariana Botelho Barbosa, doutora em Ciência e Tecnologia dos Materiais e coordenadora de pesquisa do Senai.

É nesse cruzamento de impossibilidades que a nitretação iônica emerge como solução. “Aí entra a nitretação iônica!”, ressalta Mariana. “Ela permite que seja utilizado um material macio, que não suportaria o desgaste e é perfeito para situações que ocorrem o impacto.”

O segredo está na transformação da superfície

A magia do processo reside em uma transformação cirúrgica. “A nitretação muda a superfície do material, deixando-a com uma dureza próxima de um material cerâmico e logo abaixo da superfície o material permanece macio”, explica a pesquisadora do Senai. O resultado é uma arquitetura inteligente: uma “pele” extremamente dura, capaz de resistir ao atrito e ao desgaste causado pelo contato com outras superfícies, e um “miolo” flexível que absorve os impactos sem fraturar a peça.

“Com a nitretação conseguimos aliar uma superfície extremamente dura, para suportar desgaste, com um núcleo de material macio”, complementa Mariana. “Assim, a peça suporta duas solicitações contrárias: a superfície nitretada suporta o atrito do contato com outros materiais e a peça de núcleo macio consegue absorver os impactos. A peça não quebra.”

Onde a tecnologia prova seu valor

A nitretação iônica tornou-se essencial em peças que enfrentam simultaneamente duas solicitações mecânicas extremas. “Normalmente são empregadas em peças que sofrem alto desgaste e impactos”, aponta Tiago Manoel, engenheiro metalúrgico mestre em Materiais e analista de tecnologia do Senai. “Por exemplo, engrenagens de câmbio, moldes para fazer peças de plástico e virabrequins de motor.”

A lista é sintomática: cada uma dessas aplicações representa uma fronteira industrial onde a fragilidade não é uma opção e o desgaste é uma constante.

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Em uma engrenagem de câmbio automotivo, por exemplo, a escolha não é trivial. “Fazer a engrenagem inteira de um metal ‘super-resistente’ seria caríssimo”, ressalta Tiago Manoel. Além disso, há um problema técnico fundamental: muitos dos materiais extremamente duros apresentam fragilidade. “Muitas vezes, o metal que é superduro é também ‘quebradiço’ (como vidro)”, observa o analista do Senai. “Você precisa que o miolo da engrenagem continue mais macio e flexível para aguentar o tranco e as pancadas sem quebrar.”

A nitretação iônica transforma essa restrição em estratégia competitiva. “A nitretação dá o melhor dos dois mundos: um miolo flexível e barato, com uma pele extremamente dura e resistente ao desgaste”, conclui Tiago Manoel.

O resultado prático é mensurável: peças nitretadas apresentam maior vida útil, reduzem custos de manutenção e eliminam a necessidade de trocas frequentes. Para a indústria automotiva, a redução de peso também se torna viável, pois materiais nitretados permitem designs mais otimizados sem perda de segurança. É a arte de equilibrar o impossível, e fazer disso realidade industrial.

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Amanda Alves é graduada, especialista e mestre em artes visuais pela UEMG e atua como consultora na área. Atualmente, cursa Jornalismo e escreve sobre Cultura e Indústria no portal da Itatiaia. Apaixonada por cultura pop, fotografia e cinema, Amanda é mãe do Joaquim.

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