Vivemos num tempo de urgência e métricas. Nunca foi tão difícil se permitir desfrutar a vida. Isso de maneira óbvia, despretensioso, sem ressentimento... Tudo é para ontem e para amanhã. O presente se dissolveu. Todos temos metas no trabalho, nos relacionamentos. Nos falta respiro!
Por isso a Igreja, em sua sabedoria, propõe para os Exercícios Quaresmais um tempo de oração. Parece muito impertinente ou desatualizado falar em “oração”, todavia é uma dimensão de nós que adoece na rotina se não puder olhar para dentro e para alto.
A oração expulsa demônios, diz o texto bíblico colocando nos lábios de Jesus que o mal existe, está à espreita e que só pode ser vencido com mais vigor se temos interioridade. O diabo, na perspectiva bíblica e em termos alegóricos, é pai da mentira, do dissenso e da divisão (assim é a acepção grega, “diábolos”, divisão).
A oração nos devolve a nós, naquele lugar em que nossos sentimentos e aflições costumam nos fazer estranhos. É preciso um pouco de distância de si em direção a algo maior do que a si, para poder reencontrar-se, reconectar-se.
É interessante pensar que quando os discípulos pedem a Jesus que lhes ensine a orar, a primeira palavra que sai dos seus lábios é “abbá" (do hebraico pai, paizinho) (Lc 11, 1 ss). É bonito pensar que a orfandade que nos habita, o sentir estrangeiro que nos desampara, pode encontrar em Deus refúgio. Um Deus que não é um soberano implacável, um tirano, um vigia de nossa felicidade mas um pai que ama com amor de mãe (Is 49, 15).
Oramos, meditamos, contemplamos, por protesto! A tentação seria querer dar conta de tudo, ver tudo, saber tudo. Mas se soubéssemos de tudo, que espaço haveria para o Mistério, para o Sagrado, para Deus...
Não precisa saber orar para dar o primeiro passo, o Senhor é como a mãe que interpreta balbucios. Não é sobre fórmulas prontas, muitas palavras (Mt 6,7). Oração não é barganha! É sobre fechar a porta do quarto, entrar no segredo... (Mt 6,6)
Que coisa bela pensar, num Deus mais íntimo do que qualquer amigo, mais amante do que qualquer amante (Sto. Agostinho) e que nos visita em nossos segredos. Não para punir e vigiar, ou mesmo expor nossos segredos, mas para nos banhar com o consolo que faz dos segredos lugar de Revelação e de Encontro.
O convite à contemplação entende-se a todos os credos até ao ateus. Crendo em Deus ou não, duvido alguém desmentir que precisa de um momento de contato com a transcendência, com a beleza sublime, com o infinito.
Seja-me permitido dizer, como bom marketeiro, valerá a pena ter tempo para essa proposta. Se permitir, não compromete. Encontrar, nos realiza… “Orar costuma fazer bem”: oremos…