Com um esquema de fraude à execução fiscal, a empresa de ônibus Saritur pode ter deixado de pagar até R$1 bilhão de impostos e tributos, segundo a Receita Federal. A empresa é alvo de uma investigação da Polícia Federal por fraudes à Previdência Social e à ordem tributária, sendo suspeita de desviar dinheiro de passagens antes que os recursos entrassem nas contas das companhias.
Segundo o auditor fiscal chefe da divisão de fiscalização da Receita Federal em Minas Gerais, Wagner Bittencourt, o esquema de fraude abusava de direitos da empresa para deixar de pagar tributos. O desvio de dinheiro das passagens para uma segunda empresa ocorria para que os bancos da Saritur ficassem vazios e, dessa forma, não fossem bloqueados quando a Receita fosse cobrar as dívidas tributárias.
“Neste mecanismo você declara uma dívida, mas deixa a empresa morrer e abre outra. A empresa nova começa a prestar serviços e de novo não paga os tributos, se cria uma nova dívida e passa o patrimônio para outro. Essa empresa tem faturamento e poderia pegar esse faturamento para fazer a execução fiscal, mas existe a fraude à execução fiscal, porque toda receita daquela empresa é passada para outra, inviabilizando que a procuradoria ou a receita arrecade a dívida. A sua conta seria bloqueada, mas você não tem nada na conta porque outra pessoa recebe o seu salário no seu lugar”, explica o auditor.
Wagner Bittencourt explica que vender a empresa ou passar o patrimônio não é necessariamente um crime e pode ser feito por meios legais. Entretanto, se for comprovado que o dono da empresa que deve dinheiro tem vínculos com a empresa que está recebendo o faturamento, isso pode ser considerado fraude.
“É feito de forma legal, mas de forma incorreta no sentido de abuso de forma, é ética e moralmente incorreto. Essa é a fraude à execução: eu tenho o patrimônio para pagar, mas não pago porque eu finjo que não tenho dinheiro, porque o meu patrimônio está em nome de outra pessoa. Na hora que a gente conseguir comprovar esse vínculo, a empresa com o patrimônio é chamada a participar da execução fiscal e a pagar o tributo que aquela primeira empresa devia”.
Operação da Receita e da Polícia Federal
Desencadeada nesta terça-feira (6), a operação Ponto Final cumpre 22 mandados de busca e apreensão contra empresários da família que comandam empresas de serviço de transporte público no Estado. As ações ocorrem em Belo Horizonte, Brumadinho, Nova Lima e Sabará, na Grande BH, e em Montes Claros, no Norte de Minas.
As fraudes contra a Previdência Social e a ordem tributária teriam causado um prejuízo de R$ 735 milhões aos cofres públicos. A Receita Federal, que também participa da operação, aponta que os débitos do grupo com a União - em dívida ativa ou em recurso na Receita - se aproxima de R$ 1 bilhão.
“Nós estamos procurando bens que possam suprir as dívidas fiscais destes contribuintes. Estamos buscando entender qual é o grupo econômico, quais são as empresas envolvidas e onde estão os patrimônios angariados por esses contribuintes. A quantidade de empresas é maior do que a gente tem hoje sobre a nossa vigilância, e é justamente essa operação é que vai nos mostrar quantas empresas são”, revela o auditor Wagner Bittencourt.
O grupo econômico explora o serviço público de transporte por ônibus de passageiros urbano, intermunicipal e interestadual, além do transporte de cargas e encomendas. A família que controla a Saritur e empresas associadas fornece parte do serviço de transporte coletivo em Belo Horizonte nos consórcios Pampulha, BH Leste e Dom Pedro II.
A investigação da PF apontou que os empresários criavam empresas e não recolhiam tributos. Os suspeitos se alternam nos quadros societários das empresas para dificultar a apuração das fraudes. Eles podem responder por fraudes como abuso da personalidade jurídica, sonegação de tributos, blindagem patrimonial e fraude à execução fiscal. As penas máximas somadas chegam a 18 anos de prisão.
Saritur
Em nota, o escritório de advocacia que representa a Saritur afirma que nunca houve fraude. Leia a íntegra:
“Em relação à “Operação Ponto Final”, deflagrada hoje pela Polícia Federal, esclarecemos que não há, e nunca houve, qualquer fraude contra a Previdência Social ou a Ordem Tributária Nacional.
Os impostos e contribuições devidos sempre foram fielmente declarados à Receita Federal.
A inadimplência de pagamento - decorrente da crise financeira gerada em todo o setor econômico de transporte de passageiros (iniciada em 2013 e agravada pela pandemia de COVID-19, até recentemente) - já foi apurada, declarada e transacionada com a Receita Federal. Os pagamentos estão rigorosamente em dia”
Com informações de Rômulo Ávila e Clever Ribeiro