Sandra Souza, de 36 anos, natural de Itambacuri, no interior de Minas Gerais, estava entre os brasileiros deportados dos EUA que chegaram a Belo Horizonte em um voo da Força Aérea Brasileira (FAB), às 21h10 deste sábado (25).
Assim como outros passageiros que relataram ter sido vítimas de agressões e humilhações durante a repatriação, Sandra descreveu a experiência como desumana e contou que um de seus filhos, que sofre de asma, passou mal devido ao calor dentro da aeronave:
“Ele ficou suado, ficou tipo ofegante. E eles, infelizmente, nem assim... Pegaram um papel, e eu ficava abanando ele, como se o papel fosse resolver a situação. [...] A gente ia morrer ali sufocado, foi uma tortura aquilo ali. [Tava quente] 3 horas sem ar-condicionado, imagina com criança. Um avião lotado, sem ar-condicionado, imagina que situação. Então, eu acho que aquilo foi uma tortura, uma falta de consideração com o ser humano, um desrespeito com o ser humano”, disse ela à Itatiaia.
A vendedora contou que tentou proteger os filhos do que acontecia ao seu redor para evitar que testemunhassem cenas de violência: “A gente sabe que houve confusão, mas não chegou a ver, porque eu ficava segurando as crianças para que não olhassem aquilo, porque, né, eles disseram que estavam preservando a gente. Mas eu acho que, se me colocaram no mesmo lugar com os meninos, naquela situação [das agressões], não estavam me preservando, não.”
A família, que vivia nos Estados Unidos há três anos e meio, foi pega de surpresa com a deportação, que aconteceu no dia do aniversário do caçula. “Foi devastador. Já tínhamos uma estrutura lá, sonhos. Era o aniversário dele. Íamos fazer um bolinho...”, afirmou Sandra.
Ela também criticou a forma como o processo foi conduzido pelas autoridades norte-americanas: “Se eu bato na sua porta e você me deixa entrar, eu não forcei a entrada na sua casa. Então, se você quer que eu saia, com educação, você tem que me pedir para sair da sua casa, né? Caso eu não saia, aí você vai procurar meios de me tirar à força. Mas eu acho que foi um desrespeito deles conosco nesse sentido.”
Além da deportação abrupta, Sandra revelou que estava no meio de um exame médico que não pôde concluir: “Eu estava fazendo um exame de cabeça e tinha uns fios na minha cabeça que eu precisava ficar com eles por quatro dias. Como já estava marcado, fui lá [na Imigração e Alfândega dos EUA] com os fios todos bonitinhos, né? Chegando lá, eles perguntaram o que era aquilo, eu expliquei. Aí, de repente, ele falou: ‘A senhora vai ter que tirar.’ Eu achei um descaso, porque não poderia esperar o exame. Para eles, não era importante, mas para mim era.”
Apesar do impacto emocional, ela tenta lidar com a nova realidade: “Foi um choque enorme, mas estou em casa agora, graças a Deus. Vou reencontrar minha família e amigos. Isso tem sido um alívio.”
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Algemados
A Itatiaia obteve imagens que mostram os deportados dos Estados Unidos chegando a Manaus (AM) na noite de sexta-feira (24) algemados e com os pés acorrentados. O vídeo foi fornecido pela Agência Cenarium.
Ao tomar conhecimento da situação, o Presidente Lula determinou que uma aeronave da Força Aérea Brasileira (FAB) fosse mobilizada para transportar os brasileiros até o destino final, de modo a garantir que possam completar a viagem com dignidade e segurança.
Foram disponibilizados profissionais de saúde para acompanhamento dos deportados. Segundo a Polícia Federal, eles foram acolhidos e acomodados em área restrita do aeroporto, onde receberam bebida, comida e colchões e tiveram acesso a banheiros com chuveiros.
A ministra dos Direitos Humanos, Macaé Evaristo (PT), também esteve presente no aeroporto de Confins para recepcionar os deportados.
Vídeo mostra brasileiros deportados pelos EUA acorrentados e algemados em Manaus
— Itatiaia (@itatiaia) January 25, 2025
📹 Imagens cedidas/ Agência Cenarium pic.twitter.com/GOAigkTosv
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Deportados dos EUA
Apesar de ser o primeiro voo com deportados para o Brasil desde a posse de Donald Trump, a medida ainda não reflete a nova política migratória do governo americano, mas faz parte de um acordo de extradição assinado entre o então presidente Temer e Trump em 2017.
Desde esse acordo, os dois países mantêm uma parceria que possibilita a deportação de cidadãos brasileiros que não podem mais recorrer de sua situação migratória.
De acordo com os dados mais recentes do Pew Center, de 2022, aproximadamente 230 mil brasileiros sem documentação vivem nos Estados Unidos. Desses, cerca de 30 mil já tiveram o pedido de permanência negado e, como não podem mais recorrer, estão sujeitos à deportação a qualquer momento.